Como em tantos outros dias , Isabel disse á mãe que ia lá abaixo a casa da avó Teresa, ver a bisa Júlia. Graça nunca discordava das idas da filha a casa da sua mãe. Preferia isso a vê-la enfiada tardes inteiras em casa da Zézita, sem saber o que faziam.
Nesse dia pelo caminho, Isabel começou a sentir uma certa dor de barriga coisa que não era muito habitual. Em casa da avó acabou por não demorar muito tempo. Nada a prendeu lá. Nem as revistas no quarto do tio Nélito, nem as frutas no alpendre , nem os armários recheados de biscoitos. Desta vez não investigou nada, deu meia volta depois de dizer adeus á avó velha, como carinhosamente a tratava, voltou para casa.
A mãe admirou-se por a demora ter sido tão curta e sem dar muita importância ás queixas de Isabel, aproveitou e disse-lhe que fosse ao Serrado pedir a avó Olinda que lhe mandasse umas alfaces para o jantar.
Isabel foi ,mas quando chegou junto da avó a dor de barriga era tão forte , sentindo um peso ao fundo da barriga, que mesmo ali, agachou-se e em plena luz do dia, fez xixi. Isabel não queria acreditar no que via. Em vez de xixi viu sangue. Levantou rapidamente as cuecas, e sem dizer nada á avó Olinda, que ficou a gritar por ela ainda algum tempo sem perceber o que tinha acontecido á neta, saiu aflita disparada do Serrado.
Isabel correu como o vento, até chegar a casa. Ia morrer, de certeza que estava muito mal e ia morrer. Aquilo era sangue e só das feridas é que saía sangue. Só tinha visto sangue quando cortou a perna com a garrafa de vinho quando foi á loja, e quando caiu com os tamancos numa ida a casa da avó Teresa. Das duas vezes tinha sido cozida, e agora?
Cada vez com mais dores, chegou a casa e foi imediatamente á casa de banho. Estava cheia de sangue .Voltou a observar muito bem e ansiosa e aflita tomou coragem e disse á mãe:
“estou muito mal ,dói-me muito a minha barriga e estou a deitar sangue para as minhas cuecas, vou morrer?”
A mãe riu-se da aflição de Isabel, e limitou-se a dizer:
“isso não é nada, só quer dizer que já és mulher”, e não falou mais nada.
Isabel nunca tinha ouvido falar de tal coisa. Mesmo no dia em que as colegas mostraram a zona púbica umas ás outras, não tinha ouvido ninguém dizer que a certa altura para se ser mulher, se tinha de ter dores de barriga e perder sangue.
Se ela já era mulher, para que era mais aquilo e porque não lhe tinha a mãe dito alguma coisa? Estava revoltada com aquilo, mas meio envergonhada resolveu não perguntar mais nada.
Sentou-se no degrau da porta de entrada toda encolhida, e Graça foi ter com ela e disse:
“ a partir de hoje isso vai-te acontecer todos os meses. Nesta altura tens que vestir muitas cuecas umas sobre as outras ou então usar umas toalhinhas dobradas”:
Isabel pensou que tudo aquilo era mau demais para ser verdade. Aquilo era a pior coisa que lhe podia estar a acontecer e ninguém a podia ajudar. Devia ser assim com todas as meninas, mas não deixava de ser mau.
Como é que seria possível ir para o liceu, andar todo dia fora de casa nas aulas, toda suja e com tanta dor de barriga.
Mais tarde a mãe avisou-a de que daquele dia em diante, quando estivesse “naqueles dias “ não tomava banho completo, não lavava a cabeça e na praia não podia ir ao mar. Disse-lhe a mãe que “nesses dias” as mulheres não podiam por exemplo fazer certos cozinhados, porque estes se estragavam. Bolos por exemplo, nessas alturas não havia mulher que os fizesse.
Era tudo muito mau para ser verdade. Isabel estava a aceitar tudo isso com alguma dificuldade, mas se todas as mulheres tinham de viver com essas limitações ela também teria que conseguir aceitar tal coisa.
O que mais custou a Isabel foi a declaração publica feita pela mãe á mesa ,ao pai e ao irmão ,durante o jantar.:
“a partir de hoje a Isabel já é mulher”
Se tivesse um buraco tinha ido por ele abaixo. Que vergonha!
Não gostou do ar meio zombeteiro como foi olhada, e apesar de não ter ligado a conversa nenhuma, ficou furiosa com a mãe.Nunca se tinha sentido tão observada. Corou o que pode, e não ligou aos comentários .Manteve-se em silêncio como se não fosse nada com ela. Aquela conversa deixou-a envergonhada, se pudesse tinha saído logo da mesa, coisa que não podia fazer pois o pai não iria permitir. Desde sempre que fora mulher, e aquilo era um assunto dela e de mais ninguém, até porque só ela é que estava com dores de barriga e nunca se lembrava de ter visto a mãe a queixar-se assim, nem a falarem dela por esse motivo.
Porque seria que a mãe não a tinha prevenido, nem a avó, nem ninguém? Se ela pudesse não queria nada daquilo.
Mas se agora ela já era mulher, o ideal seria que os pais começassem a tratá-la como tal. A deixa-la ir aos bailes da aldeia com a avó Teresa, aos arraiais de Verão, ás excursões, e a todos os sítios divertidos onde as meninas muitas vezes na escola comentavam que iam, e onde ela nunca tinha permissão de ir ainda que a avó Teresa insistisse sempre em a levar.
Isabel estava revoltada e confusa. Não estava preparada para aquilo, já tinha falado tanto com a Zézita e nunca tinham falado sobre este assunto. Teria que conversar com ela muito a sério.
Só mais tarde nas suas viagens de comboio para o liceu veio a saber pelas colegas com quem viajava, que aqueles dias eram importantes para todas as mulheres, e que um dia quando se casasse e ficasse grávida,
é que deixava de ter essas visitas mensais, para voltarem depois do filho nascer. Na altura esta explicação pareceu-lhe razoável, ainda que nunca tenha tido mais nenhum esclarecimento dado pela mãe.
Aprendeu com as amigas que um comprimido Aspirina ou Melhoral assim como um saco de água quente na barriga poderiam a ajudar a aliviar as dores. Só mais tarde com o aparecimento dos pensos higiénicos Serena avulso, a vida de Isabel ficou melhorada. Acabavam assim os dias em que vestia dezenas de cuecas e em que o seu rabo aumentava para o dobro sem isso evitar que as suas coxas ao roçarem, se fizessem todos os meses em ferida.
Isabel entendeu que tudo aquilo era importante para a realização de parte dos seus sonhos "ser mãe"
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