segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Regresso

Camila e Neva abraçaram-se carinhosamente. Neva, sabia aquela história toda, do tempo em que Alberto se perdia pelos bares a beber mais um pouco que o habitual, porque perdera o seu grande amor. Toda a cidade sabia que ele tivera um grande desgosto de amor, mas ninguém podia imaginar que ele casara com uma mulher essencialmente porque a achara muito parecida com a essa mulher desaparecida, isso nem

Camila imaginava, e muito menos, sabiam que em casa ele mantinha fechado o quarto, que devia ser para ele na altura e para essa mulher, porque lhe tinha prometido antes de ela morrer no dia do acidente, o que no mínimo era aterrador. Esse quarto era o elo para o manter ligado a essa mulher que já não existia, e isso não podia acontecer.


Mas Neva também não sabia o monte de duvidas que ia na cabeça de Camila, que inclusive imaginava que essa mulher podia ainda existir algures e ser visitada ainda por Alberto.

Alberto devia ter contado a Camila todo o seu passado e não devia ter mantido esse quarto em casa, e muito menos ter passado horas a meditar fechado dentro dele. A vida de ambos estava um caos, porque não tinha havido qualquer diálogo na sua relação.

Camila dizia adeus a uma parte da sua vida e voltava para Múrcia definitivamente com a esperança que Alberto um dia se lembrasse de ir ter com ela para esclarecerem tudo finalmente. À medida que o tempo passava reconhecia que tinham assuntos comuns a tratar, mas teria que ser ele a dar o primeiro passo.

Pegou um avião com o espírito tomado de uma tristeza desconcertante, ao mesmo tempo que partia triste pelo que o marido lhe fizera, também sabia que fora ali que crescera como mulher e fora mãe. Consigo, levava o seu bem mais precioso, o filho, e esse não o daria a ninguém, nem permitiria que ninguém, alguma vez lho retirasse.

Um ultimo adeus quando entrou no avião e para trás ficaram as cenas de violência, o desamor e tudo o resto, pois nesta altura ela ainda não sabia que Alberto já reconhecera o seu enorme erro.

domingo, 26 de dezembro de 2010

Camila sai de casa

Em casa de Diego, em completo silêncio, Camila tomou um pequeno-almoço que ele lhe arranjou, deu mama a Carlinhos, reorganizou as malas, e vestiu-se de outra forma.
Ainda não tinha conseguido parar de chorar, mas Diego que conhecia o passado de Alberto imaginou alguma cena na noite anterior, desconhecendo no entanto que Alberto mantinha um quarto fechado em casa, ainda se arriscou a dizer:

-Tem calma, mais tarde vocês conversam melhor e tudo isso tem solução.
- Não sabes o que estás a dizer, nunca conversamos nada não é agora que quero conversar sobre coisa nenhuma o que está mais que evidente. Também não foste muito meu amigo, mas também te entendo há coisa que são entre marido e mulher unicamente.

-Vês que que sabes. Então acalma-te que mais tarde depois de descansares um pouco virás tudo de outra forma.

-Se fores à rua compra-me uma papa para o Carlinhos, e passa pela loja de Neva a perguntar se precisa de uma empregada para a ajudar na loja. Só que tenho que levar comigo o meu pequenote, mas como é muito calmo não perturbará o meu trabalho. Preciso de pensar o que fazer à minha vida.

- Mas não vais voltar à quinta Camila?

-Não, nunca mais. Fui enganada.

-Como?

-Não é nada contigo, um dia poderemos falar, hoje não. Deves saber bem mais que eu, mas hoje quero e daqui pensar o que fazer da minha vida e preciso que ninguém saiba onde estou, entendes?

-Mas e Alberto?
-Morreu.
-Como?
-Pensei que eras mais inteligente, acabou.
Diego saiu a correr e foi fazer o que Camila lhe pediu.
Foi comprar a papa para o Carlinhos e passou pela loja de Neva a comentar com ela o sucedido, e a pedir-lhe emprego para Camila. Entediam ambos, que o casal devia ter conversado acerca da relação que Alberto tinha tido com uma jovem que realmente ele amara muito, mas que morrera de acidente algum tempo antes de ele ter conhecido Camila. Quando tempos atrás forçados por Camila, lhe tinham contado algumas do passado de Alberto. Diego quase escorregara a contar-lhe esta história, mas com a ajuda de Neva, ela tinha sido convertida na história de uma jovem que o tinha perseguido fixamente com o desejo de casar com ele dizendo que estava grávida.
 É que esta jovem não existiu, e por ela Alberto nunca esteve apaixonado. Na altura do acidente Alberto ficara um pouco transtornado, até desequilibrado, mas ninguém sabe o que vai dentro da mente humana. Desde que apareceu com Camila, parecia mais seguro e confiante e ninguém sabia se tinha ou não contado o seu passado à noiva, e muito menos que em sua casa tinha um quarto fechado.

Diego falou com a irmã da possibilidade de Camila se mudar para a loja pois realmente ao fundo existia um estúdio onde ela poderia ficar o tempo que quisesse até reorganizar a sua vida logo que não contasse ao marido para este não ir falar ao Alberto no trabalho, já que trabalhavam juntos.

Neva ficou feliz com a ideia, e foi tudo uma questão de tempo. Em breve Camila estava devidamente instalada no estúdio da loja com Neva. Precisava pensar, descansar e saber o que fazer da sua vida. Há muito tempo que não trabalhava, e tinha que repensar toda a sua vida novamente, mas naquele momento a maior ferida era a do seu amor magoado.
Estava tão triste que nada lhe interessava de verdade, perdera o seu amor, a sua vida não iria ter mais interesse. Tinha entregado aquele homem toda sua vida e afinal ele não era nada seu, nem conhecia nada dele. E estes pensamentos e outros semelhantes, mortificavam-na constantemente.


Olhava o filho com amor e ternura, e não conseguia evitar que as lágrimas lhe deixassem de cair dos olhos continuamente. Pelo menos o seu filho nascera de um acto de amor, de verdadeiro amor, pelo menos da sua parte, o maior amor do mundo.

 

Fotos do Goggle

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

As chaves

A forma como Camila foi recebida pelo marido não lhe foi muito agradável, e no amanhecer do dia seguinte acordou virada do avesso, como se o tempo lhe tivesse revirado as entralhas, a fizesse vomitar, lhe tivesse dado volta à cabeça, e lhe fizesse ver as coisas com mais clareza.
Parece que estava tudo muito claro. Só era preciso abrir a porta.


De um momento para o outro parecia ter perdido o medo de tudo e todos, o decoro, o receio fosse do que fosse, naquele dia como um vendaval, estava disposta a tudo, levaria à frente dela tudo o que lhe aparecesse pela frente, mas estava decidida a descobrir o que estava para lá daquela porta.

Estava determinada e havia de conseguir entrar dentro daquele quarto.

Depois do pequeno-almoço, cuidou do Carlinhos como era habitual e sem pedir informações a ninguém, começou a vasculhar em tudo quanto era gavetas e gavetões que encontrou acessíveis no salão das refeições, quando este ficou sem ninguém.
Precisava encontrar o que pretendia e não nada a dissuadiria desse propósito.

Numa pequena gaveta bem disfarçada de uma escrivaninha SEC.VXII, encontrou um molho de chaves que especialmente lhe chamou a atenção pois tinha um porta-chaves com a letra (A).


Guardou-o como uma relíquia valiosa na sua mão e sentiu-se tremer completamente como se um raio a tivesse percorrido e arrasado completamente.

Teve a nítida sensação que aquela era a chave do mistério.


Fotos da Goggle

Mensagens de NATAL

Feliz natal a todos vós

Camila

Camila vai para casa resolvida a tomar muitas resoluções. Precisa saber porque toma Alberto atitudes inconcebíveis.
Não a convida para sair, não conversa com ela de trabalho nem dos amigos nem do passado nem de nada, não vão ao cinema não voltaram a planear fazer férias. Camila estranha todos os comportamentos de Alberto, mas está curiosa para descobrir algumas coisas da sua vida passada.  Por outro lado, quando lhe sussurra ao ouvido ele transforma-se completamente e parece outro homem.

Mal chega a casa, resolve ir até á cidade fazer uma visita aos amigos. Telefona a Neva e combina com Diego a hora para se encontrarem na loja de Neva para marcarem os encontros no estúdio e começarem as sessões de pintura. Diego não falta ao encontro, acha que Camila está com um brilho diferente no rosto, mais resolvida, e que o trabalho vai resultar em pleno.

O primeiro encontro no estúdio resulta em pleno e tanto Carlinhos como Camila suportaram aquelas duas horas estoicamente.

No fim da sessão Camila estava feliz e Carlinhos com fome exigia mama. Camila antes de sair para casa deu-lhe peito. Aquela sim era, uma cena que Diego gostaria de pintar mas estava proibido.


Para evitar complicações Camila pede ao motorista que viesse busca-la à loja de Neva e passa a ser assim daí para a frente.



Fotos do Google

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Nocturno

                                           Me sinto em mim um soluço
                                                 Pedadelo d`amargor
                                          O abismo eterno em que me debruço
                                                 É eternidade sem amor...»
                                           E assim, com um soluço
                                                 Esvai-se a voz de dor.

                                           
                                            Quando fores grande-- dorme!--
                                                  Este conto contarei...
                                             Por hora na noite enorme
                                                  Enquanto te embalarei
                                            Ignora tudo, criança, dorme, dorme,
                                                   Dorme que eu velarei....
                                                                                       
                                                                               
                                                                                        De :FERNANDO FESSOA
                                                                                       Poesia do EU

domingo, 12 de dezembro de 2010

Camila toma decisões

- Tardaste, já se ia fazendo tarde, mas sabia que virias mostrar-me o nosso menino. Onde está ele, quero vê-lo pois preciso descansar.

Camila chegou-lhe Carlinhos bem perto dela, e baixinho, ela disse logo:

- Um menino forte e lindo como tu eras minha filha, tal como Geraldo sonhou ter, se estivesse aqui connosco. Estou cansada, cuida bem dele, e de ti minha filha.
E caiu num sono, que parecia profundo.
Dali Camila foi para casa da mãe.
-Pia não está. Júlio internou-a, pois desde que chegou há cerca de um mês de tua casa, os parâmetros e alguns exames não estão bem. Ela não queria, mas a semana passada antes de saber que virias assim tão rapidamente, Júlio resolveu interna-la, para conjuntamente com o cardiologista confrontarem todos os exames, e com ela em repouso absoluto, ver a que conclusão chegam. Pensam que seria melhor Pia ser operada em Madrid, mas querem também ouvir a tua opinião, além de ouvirem a da tua mãe naturalmente.

-Nem sei que te diga. Mas far-se-á tudo o que for melhor para ela ficar boa. Quero que a minha mãe fique bem dentro do possível, para poder ver crescer o Carlinhos.
E Camila dizia isto, triste como nunca imaginara poder estar, numa circunstância semelhante, pois nunca imaginara a mãe uma mulher doente, muito menos em risco de vida. Sentir que podia perder a mãe, agora que também era mãe, tinha uma dimensão que até ali ela nunca supusera ser possível viver.
Entretanto Giullia não voltou a acordar, parecia que esperara mesmo pelos seus meninos, pois adormecera e não reagira muito mais a outros estímulos, e nos restantes dias que viveu, foi alimentada a soro.
Tinha cumprido a sua missão de protectora, irmã, conciliadora, amiga, mãe, porque Giullia, na terra enquanto viveu foi tudo um pouco e não só empregada daquela família. Agora descansaria em paz, mas para Pia era como se ainda estivesse a descansar no lar. Para a poupar desse desgosto não lhe disseram da sua morte e guardaram para mais tarde, dar-lhe essa notícia.

Como era de esperar Alberto não tivera disponibilidade para vir ao funeral de Giullia, e os amigos mais chegados de Camila notaram a sua ausência, mas Camila com muita diplomacia desculpou muito bem a sua ausência, mas estes acontecimentos deixaram-na muito abatida.

Eram demasiados acontecimentos negativos para suportar sozinha. Só Carlinhos na sua tenra idade, lhe dava uma força enorme que mesmo ela desconhecia ainda em si.

-Com todos estes acontecimentos e sem Alberto por perto, não tenho qualquer vontade de fazer nenhuma festa com os nossos meninos.

-Tens razão minha amiga, o teu marido não te dá apoio nenhum. Não te quero pôr contra ele, mas custava ter vindo aqui agora que morreu Giullia que ele conhecia tão bem, não custava nada?

-Disse-lhe, mas não lhe pedi. Agora vou resolver tudo de outra forma. Se as coisas não andarem como penso, digo-te a ti que és minha amiga sincera, venho-me embora de vez. Separo-me dele.

- Como? Já chegaste a esse ponto? E essa paixão que sentes por ele, esse amor quando estão juntos, como fica?

-Muito bem, acaba, tem que acabar, porque me destrói, e eu hei-de ser capaz de suportar essa dor que não há-de ser maior que todas as dores que ele me faz passar desde que casámos. Sofro desde do dia que saí de casa da minha mãe casada com ele, ou por uma coisa ou por outra.

-Mas, estás então resolvida. Eu no teu lugar não te censuro, pois já o teria feito há muito tempo. Conheces-me bem e sabes que não lhe aturava metade do que já lhe aturaste.

-Digo-te, que a primeira coisa que farei é tentar saber o que está dentro daquela divisão fechada à chave a que me foi barrada a entrada. Quando chegar a casa vou rebentar com a porta daquela divisão trancada, que me intriga desde o início, onde ninguém pode entrar, ou pelo menos eu não posso entrar, e saber o que está lá dentro. Se aquilo era um escritório com livros do avô do Alberto e outros documentos antigos, precisa ser muito arejado, senão vai ficar tudo danificado, não concordas? Porque não se abre nunca aquela maldita porta?

-Mas vais mesmo rebentar aquela porta?

-Claro que vou, ou não me chame Camila. Algo me diz que a minha felicidade passa por aquela porta, e há muito que decidi fazê-lo, mesmo antes de Carlos Geraldinho nascer. O meu filho devia chamar-se Geraldo, que era o nome do meu falecido pai, mas teve de chamar-se Carlos por vontade expressa de Alberto. Se permiti isso, vou poder fazer o que quiser do quarto do bisavô, que deu o nome ao meu filho.

-Estás com garra, estou a gostar de te ver. Força, e o teu trabalho e o carro, já pensaste nisso?


- Vem a seguir. Primeiro o carro para me libertar do motorista e depois o trabalho. Juro que apesar de ter prometido o contrário a Alberto voltarei a trabalhar.
Afinal também ele não tem nada a ver com o homem com quem casei.


-Não auguro, nada de bom na vossa relação, mas tu lá sabes.


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sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

O bebé de Camila

Passados quinze dias do nascimento de Rafaela, nasceu o bebé de Camila, e Pia não se enganou, foi um menino que Camila teve. Alberto estava louco de alegria. Os pais dele também. Não tendo mais nenhum filho, viam com o nascimento daquele neto, aumentada assim a sua família.

-Alberto, gostava que o nosso filho tivesse o nome do meu pai, Geraldo, gostava muito, e a minha mãe também. O sonho dele era ter um neto.

-Amor, o primeiro nome do nosso filho será Carlos que era o nome do meu avô.  O meu pai ficaria revoltado, furioso se ele não fosse Carlos. O nosso segundo filho será Geraldo, porque vamos ter muitos filhos, lembras-te?

- Não, não, então será Carlos Geraldo, porque não sei se terei mais filhos homens, nem sei se terei mais filhos. Agora só quero cuidar deste muito bem.
Camila, não tentou contrariar Alberto, sabia que não resultaria.


- Teremos muitos filhos lindos como o Carlos e como tu.

O nosso filho é lindo como tu.

Estou muito feliz, amor.

 Obrigada.(E beijou-a na testa com imensa ternura).





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O amigo Diego

Depois que soubera do passado de Alberto estava mais arisca, mais destemida, quase que lhe apetecia constantemente provocar o marido para ver qual a sua reacção. Um dia ainda haveria de descobrir porque a escolhera a ela para casar, se seria mesmo só por amor.
Não conseguia tirar isso da cabeça.


Num desses encontros, Diego segredou-lhe, que sem saber muito bem como, visto que Marta se cuidava ao máximo, ia ser pai, e se ao princípio ela ficou um pouco aborrecida pelas horas que isso lhe ia roubar ao trabalho, passado algum tempo começou a adorar a ideia de ir ser mãe. Diego estava feliz, pois há muito desejava ser pai.

Se Alberto sonhasse destes encontros, Camila teria a vida feita num inferno. Sem saber porquê, gostava de falar com Diego porque junto dele ria livremente, dizia disparates ou coisa sérias, tudo o que lhe vinha à cabeça lhe era permitido, falava da mãe, contava sobre as suas consultas no médico e sobre o bebé, ou então estavam em silêncio, ouvindo música ou lendo, tudo na loja de Neva.

Diego gostava muito de Camila, e já lhe dissera, que se depois do bebé nascer, se Marta continuasse sem lhe prestar atenção, pensaria se se divorciava ou não dela. Ficava com o filho e ela iria à sua vida. Encontrar-se-iam para tratar das coisas do filho e nada mais.
Melhor que passar a vida a discutir. Eram grandes amigos e haviam de chegar a um acordo, dizia sempre a Camila que detestaria passar uma vida de solidão ou pior ainda, de discórdia e desentendimentos.

Camila que tinha imensas desavenças com Alberto concordava com Diego, mas sentia-se incapaz de viver sem o amor do marido. Ele amava-a de uma forma apaixonante, e quando se entregava a ela, fazia-o de uma forma que também ela deixava de existir no seu corpo e era como se os dois passassem num certo momento a ser um só.



 Ela não tinha a certeza de ser capaz algum dia de sentir isso por mais alguém.

 Com Alberto estava totalmente entregue, porque o amava em toda a plenitude.



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quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Camila visita Pia

 O que lhe importava era que a filha fosse feliz. Mas se verificasse que não era, teria que interferir.

No dia seguinte Camila constatou que Giullia estava muito fraca. Estava com 86 anos, muito lucida, mas muito débil. Quando esta a viu chorou muito, e foi difícil fazer com que deixasse de chorar. Ao contrário do que era de esperar, quando Pia lhe falou, um pouco mais tarde do menino que Camila lhes ia dar, sorriu de felicidade comentando:

-Era do que estava à espera, agora já posso ir, ohm não, primeiro quero ver o nosso menino.
Camila comoveu-se, afagou-a, beijou-a na testa, e disse-lhe:

-Tens que fazer tudo o que Júlio te manda, para isso acontecer, e saíres daqui depressa e boa. Quero que cuides do nosso “menino “.

Deixaram Giullia a descansar e foram fazer os exames de Pia.
Júlio foi incansável, toda à tarde.

Enquanto Pia e Júlio estavam nesses exames , Camila aproveitou e comentou com Reina tudo o que soube acerca de Alberto do tempo de solteiro, que Diego lhe tinha contado:

“De ele ser namoradeiro (coisa que não a admirou nadinha), e muito apaixonado, tão mandão e possuidor e com um feitio esquisito que teve várias namoradas e nenhuma ficou com ele por não o suportar.
E a ultima, que teve uma grande paixão por uma mulher, que morreu de acidente.
Camila contou a Reina que desconfiava que aquele quarto fechado na sua, casa devia conter coisas dessa mulher, e que desde que soubera desse caso só queria esquecer, ter o filho em paz, mas depois havia de descobrir o que estava naquele quarto”. Dizia ela:

-Agora quase  percebo porque não conduz a mãe e não me deixa conduzir a mim. Mas será que sou parecida com ela? Será que me ama mesmo? Será que é nela que pensa quando faz amor comigo? Diego disse-me que ela foi uma grande paixão dele.

-Não penses nisso. Claro que te ama. Ele adora-te, mas se te voltar a fazer mal, possuído seja pelo que for, se te violar ou violentar fisicamente, tens que o chamar à razão e dizer-lhe que não pode ser assim.
Se for preciso, não to disse na tua casa, mas aqui vou dizer-to com franqueza, vens-te embora.
Deixas a casa dele, e a ele que te maltrata. Mas creio que isso não voltará a acontecer. Vais manter-me informada que dar-te-ei todo o meu apoio.

- Não sei se serei capaz de viver sem esse homem. Pensar que teve outras mulheres na vida antes de mim, que pode ter desejado e amado alguém mais que a mim, é um sofrimento que custo a suportar.
Pensei que as suas mãos ao tocarem o meu corpo, não tinham termo de comparação, como as minhas que nunca se afundarem nem se perderam por mais ninguém.
Como fui terrivelmente ingénua minha amiga.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

A minha vida

Nestes três metros quadrados, tenho que aprender a gerir as minhas emoções,
 a calar a dor do coração, os pensamentos crueis com que a mente me perturba.
Afinal que faço eu aqui?
Simplesmente espero por ti, porque sem ti não valho nada, não presto,
sou simplesmente um pequeno e insignificante estorvo.
Eles já partiram há muito tempo,
Estão livres, adultos, cresceram e eu nem dei conta.
Mas eu não consigo arrancá-los do meu peito.
Vivem comigo, como quando eram meninos.
Povoam o meu pensamento, permacem em mim como uma doença.
Para eles já não sou nada.
Mas fazem-me falta, sinto-lhes a ausência, ainda lhes chamo "meus"

Que saudades tenho desse tempo, quando vinham para casa....
Quando eram os meus "meninos"
Agora, neste quarto espero por ti, porque na casa grande estou só,
e tenho medo, e frio, e medo, muito frio e medo.
E aqui?
Aqui  tudo é um diferente, quase horrivel!
Quase tudo já me aconteceu.
Afinal onde é maior a minha solidão?
Estou sempre só, aqui e lá, e em toda a parte.
Sem eles, sem ti, nunca mais serei como fui antigamente.
Estarei sempre só, mesmo quando estou com muita gente.
Não sei que me aconteceu.
Foram tantas perdas, tantas, que lhe perdi a conta.
Até a mim me fui perdendo devagar, até que cheguei aqui, a este ponto.
Se não falar contigo, pouco mais tenho com quem falar....
Porque tudo o que os outros dizem é mentira.
E eu vivo muito de fazer de conta.
O que queria mesmo, era  ter força como antes,  não ter dores, que eles viessem  mais a casa,
Que a mim me desse vontade de fazer o jantar, o almoço e tudo o resto...
Que estivesses em casa como os velhos, como eu...
mas só eu sou velha..

Agora, neste quarto minusculo de três metros quadrados, aguardo por ti,
E os meus olhos choram, porque o vazio que sinto é tão grande
como o espaço que eles deixaram  dentro de mim.
 É um vazio imenso E infinito.
E tenho  medo do que sinto, porque não tem limite.
Parece que tudo me acontece e aos poucos a minha vida se degrada, e caminha para um fim.
Afinal que me irá acontecer depois de tudo isto.

O ultimo espaço que nos espera é bem mais pequeno  do que este.
Vou imaginar, que estou no céu, preciso de acalmar com isso.
Estou aqui também por eles,  para que aqueles que sairam de mim estejam bem.
Mas não é fácil pensar, que a vida passa, que tudo passa, e que amanhã quando voltares de vez para junto de mim já não terei, talvez, força para te ouvir, para te ver, para te falar, quem sabe até, se ainda estarei por aqui nalgum quarto, nalgum espaço, à tua espera como agora.
A vida é muito ingrata.

domingo, 5 de dezembro de 2010

Camila visita a mãe

Alberto tinha sido muito namoradeiro, muito exigente, tirano mesmo, e por isso ninguém o aturou, tudo isto depois de uma grande paixão que teve, mas que morreu de acidente.

-Mas nenhuma te chegava aos pés.
 Disse Diego, que olhava Camila sempre com muito carinho.
- Cuidado, sou casada, e bem,  tens a tua mulher, não quero criar-te problemas, nem os quero para mim, só quero conhecer melhor o passado do meu marido, só isso.

Mas no coração de Camila estava instalada uma grande dor, um vazio, um sentimento que naquele instante não conseguia explicar, que nem sabia se era dor, mágoa, despeito.
Mas Diego continuou:

-Marta nunca tem tempo para mim, não me liga nenhuma. Anda sempre em congressos, palestras, ou simplesmente nas aulas, mas não tem tempo para mim. Nunca me visita no estúdio.
Já não somos o casal que éramos há quatro anos, quando casamos. Nunca está disponível para mim, percebes? Somos bons amigos, não discutimos, até nos damos bem, mas só isso, e um casamento não pode ser só isso.

-Mas porque não lhe dizes?
-É o que faço sempre que estamos juntos, mas a carreira dela é muito importante para ela, não tem tempo para nós, para termos um filho, eu por outro lado penso fazer uma exposição algures e como ela nunca pode ir comigo, desanimo, desisto sempre. Ultimamente penso mesmo, que o melhor é separarmo-nos.
-Dizes-me que te vais separar? Se o Alberto sabe disso, nunca mais nos podemos encontrar. E riu-se muito.
-E ele tem razão.
-Que dizes?
-Nada, nada, que gosto muito de conversar contigo e gostaria de pintar o teu rosto. Apanhar esse azul dos teus olhos, que me lembram o mar ou o céu, não sei, depende da luz do dia, mas gostava de te pintar.
-Pareces o Alberto a falar. Não sei se ele permitiria, tenho de lhe falar.
- Não falas nada, assim não tem graça, pinto-te e depois fazes-lhe uma surpresa, fazendo-lhe a oferta da tela, que tal?
-Vou pensar, depois digo-te algo, está bem.
-Fico a aguardar.

Diego acabou por sair e deixou-a embaraçada e intrigada. Acabou por comentar com Neva, primeiro que não tinha jeito nenhum para posar e decerto não faria nada daquilo que Diego lhe estava a propor, mas principalmente que estava deveras intrigada com o passado do marido. Neva, não acrescentou nada ao que Diego dissera, limitando-se a encolher os ombros e a dizer-lhe que não desse importância ao que o irmão lhe estivera a contar.

Nenhum deles sabia, contudo, como era realmente a vida de Camila com o marido, pois esta vivia em silêncio dentro da sua casa e do seu quarto e guardava só para si, todas as reacções menos próprias que o marido tinha para com ela, magoando-a, massacrando-a, de amor ou de ciúme, mas sempre com os seus exageros de poder, domínio e alguma violência sobre, ela como se fosse seu dono ou senhor.

Até aquela altura, fora incapaz de comentar com alguém, além de Reina, a sua vida intima com Alberto, um pouco por medo, um pouco por despeito, um pouco por vergonha, até porque esperava que tudo aquilo passasse, senão antes, pelo menos quando o filho nascesse. E depois ele amava-a tanto, fazia amor com ela como ela nunca imaginou ser possível alguma vez algum homem fazer. Sentia que não seria capaz de viver sem Alberto, alguma vez na vida, ao mesmo tempo que ele a magoava, ela desejava-o intenssamente.
 Estava presa aquele homem para sempre. Mas que o passado de Alberto estava a influenciar a sua vida, agora ela quase tinha a certeza. Podia ser feitio, mas também algum desgosto no passado. Mas ela que culpa tinha?

Com estes pensamentos Alberto apareceu a buscar Camila, que saía da loja um pouco confusa com todos estes pensamentos, mas mais conhecedora do passado do marido, se é que isso viria ajudar em alguma coisa a resolver a sua vida, a entender o seu futuro.
Ao sair da loja o que mais desejava agora era chegar junto da mãe.
Mais que nunca queria chegar a Múrcia, estar só sem Alberto por perto e voltar a falar com Reina. A vida dela estava a ficar uma confusão, e naquele momento queria paz. Depois de ver a mãe e regressar a casa queria encontrar paz junto de Alberto tentar compreendê-lo, amá-lo, deixar-se amar e viver a sua gravidez.
Depois do filho nascer, conforme as atitudes do marido nesse tempo, procuraria saber mais sobre o seu passado.
Gostaria também de se informar de algo mais concreto, em relação aquele quarto que estava sempre fechado à chave e que de certa forma a intrigava.


Mas naquele momento o que lhe importava além do estado do filho que era óptimo, segundo o médico, era a viagem que faria no dia seguinte até Múrcia.


No dia seguinte no aeroporto, quem visse os dois a despedir-se, parecia que ela ia viajar por meses ou anos, tal era o rol de recomendações que Alberto lhe fazia.

Fotos do Google

A visita de Reina

Camila tinha que ser forte, e tentar resistir-lhe, ele precisava saber que ela não era um objecto, ou uma coisa para ele usar quando lhe apetecesse, mas uma pessoa, uma mulher com vontade própria que ele tinha que respeitar, como ela a ele. Não podia tê-la em casa só para se servir dela a seu belo prazer, ainda que de certa forma ela tivesse sido conivente com esse trato.

Ele era muito apaixonado, amante e fogoso, sedutor, mas provavelmente em demasia. Era preciso que deixasse espaço para que Camila respirasse, fizesse coisas diferentes, que lhe dessem vida e alegria, para que quando chegasse o fim do dia e ele regressasse a casa, ambos estivessem desejosos de se reencontrar. Todos os dias deveriam saber a um novo reencontro cheio de ternura.

Reina, estava admirada e não tinha como comentar a violência de Alberto, mas deu força à amiga e convenceu-a de que podia ser tudo do início do casamento. Ambos se amavam e desejavam muito, e na verdade Alberto gostava demais de Camila.



Podia ser excesso de tudo, tinham que aprender a dominar os seus instintos.

Talvez com o tempo e depois com o nascimento do filho, as coisas tomassem outro rumo.

Não havia outra forma de ver o assunto.


Fotos do Google

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

A gravidez

Gradualmente Camila pensa fazer algumas alterações na sua nova casa, esperando apoio e ajuda do marido para fazer escolha de alguns móveis novos, cortinados e peças decorativas, mas o apoio que encontra é muito pouco ou nulo. Alberto demasiado ocupado com o seu trabalho nos vinhedos, deixa esse trabalho para ela e dois empregados, que ordena a acompanhem para o que for necessário. Camila, sem o apoio de Alberto desmotiva e poucas alterações faz na casa. Naquela casa Camila sente que não será feliz. Prece que o Sol nunca lá entrará. A casa tal como ela está cada vez mais triste e negra.
É numa dessas suas idas a Logroño, que Camila consulta um médico e confirma a sua gravidez. Este estado que tempos atrás a teria deixado radiosa de felicidade, naquele dia deixou-a feliz, mas apreensiva. Um dia tinha sonhado quando soubesse que ia ser mãe ter Alberto a seu lado, e naquela altura nem sabia quando estaria com ele para lhe dizer. Desde que começara a trabalhar, Alberto chegava sempre muito tarde a casa.

Precisava cada vez mais, conversar com Reina.

-Preciso urgentemente de falar contigo. Gostava que viesses a minha casa. Queria contar-te da minha lua-de-mel. Aqui não tenho amigas e tenho saudades das nossas longas conversas nocturnas. Preciso que me fales da minha mãe. Tenho novidades para ti. Convence o Júlio e venham os dois, daqui a uns dois meses irei eu aí, mas primeiro preciso que venhas aqui….

E tanto pediu, que convenceu Reina a visitá-la um fim-de-semana prolongado. A mãe de Alberto iria fazer anos, e combinaram para essa altura a sua visita. Júlio ficaria em Múrcia, por questões de trabalho, e Reina viria até Rioja, no fim-de-semana seguinte.

Cada dia que passava Camila ia conhecendo melhor Aberto. Desde que fora ao médico em Logroño, ainda não tivera oportunidade de falar com o marido. Uns dias por um motivo, outros por outro, chegava sempre muito tarde a casa, e depois com aquela paixão avassaladora que tinha por ela, quando estavam a sós, quase não pensava em mais nada senão em se envolver freneticamente com Camila, não a deixando quase falar. Era um homem apaixonado, sensual mas ela ainda não sabia até que ponto ele era dominador e autoritário. Enquanto namoraram, foi calmo, terno, meigo, carinhoso, delicado, esperou por ela o tempo que foi preciso e nunca tentou ou propôs nada sexualmente, senão quando ambos o desejaram muito.

Trabalhos relacionados com pessoal, diagnósticos diversos, formações várias, congressos, serviços de qualidade, adaptação aos tempos modernos, para que a rentabilização nos vinhedos fosse excelente, e as vendas das castas e vinhos, cada ano, superassem o anterior, ocupavam muito o tempo de Alberto deixando Camila muito só na sua casa, distante da cidade, num local onde ainda não tinha amigos e não conhecia bem.

Camila não se identificava com aquele ambiente, era uma jovem citadina e portanto aquela quinta ainda que muito bonita, tornava-a mais triste ainda. Ainda que os pais e empregados da casa a tratassem muito bem, desde que casara Camila era outra mulher. Mais triste e só com saudades da mãe e de Giullia, não esquecia a sua cidade. Estava aborrecida de passear pelo jardim sozinha, de estar em casa sozinha, de visitar a cidade sozinha, de ir às compras sozinhas. Havia uma coisa que ela tinha a certeza, tinha saudades do Alberto que conhecera. Amava muito o seu marido, e precisava estar com ele muito mais tempo.

Ainda não conhecia nenhum amigo de Alberto, mas naquele dia à noite iam finalmente jantar com um grupo de amigos dele, e ela estava entusiasmada.

-Amor, vamos jantar com um grupo de amigos, vais gostar deles, disse Alberto.
-Óptimo, estou desejosa de fazer amigos qui. Sinto-me tão só.
E aproximando-se de Alberto, tocando-lhe no peito, disse-lhe quase em tom de segredo:
-Sabes o que te queria dizer no outro dia:-vamos ser pais, fui ao médico em Logroño, e tenho a certeza, vamos ser pais, por isso tenho andado tão enjoada. Estás feliz como eu?
- Claro que estou minha querida, muito feliz.
E agarrou-a, beijou-a, andou com ela ao colo, rodopiou e dançou com ela, e com carinho colocando-a na cama envolvendo-a como de costume, amou-a ali plenamente como se ela fosse coisa sua, ainda que Camila lhe tenha dito, “agora não Alberto”.

Saíram para jantar, e iam aparentemente felizes. Daí a sete meses iriam ser pais, não tinham motivos para estar tristes ou preocupados.
O grupo de amigos encontrou-se num restaurante de tapas, uma tapería, perto do centro da cidade de Logoño, onde experimentaram várias meias doses e provaram vários vinhos. A noite passou-se muito agradavelmente. Alberto contou a todos o facto de ir ser pai e toda a noite se mostrou atencioso para Camila. Todos estavam presentados. Três casais, Neva e Eduardo, Manoela e Gustavo, Diego e Marta, todos muito simpáticos, simpatizaram logo com Camila, que também se sentiu encantada por todos eles. Eduardo e Gustavo eram colaboradores de Alberto, Diego era pintor e irmão de Neva que tinha uma loja de roupa e acessórios na capital, Logo-ño. Manoela não trabalhava fora, limitava-se a cuidar dos folhos e da casa, tal como Alberto combinara com Camila que seria o que ela faria no futuro, e Marta a esposa de Diego, era professora de línguas estrangeiras na universidade.

Conversaram muito e depois do jantar passearam um pouco pela Plaza del Mercado, junto da Catedral Redonda pois nessa noite tinha lugar aí uma festa nocturna da cidade. Camila sentiu uma empatia maior por Diego, e foi com ele que conversou mais algum tempo. Com todos ficou combinado que sempre que ela fosse a Logoño, telefonasse para se encontrarem e saírem juntos. Um deles haveria de estar disponível. Manoela ou Diego teriam sempre tempo para estar com Camila, e na loja de Neva haveria sempre um cafezinho e um sofá para juntas conversarem um bocadinho.

A noite tinha corrido muito bem, mas Camila estava cansada queria regressar. Despediram-se, e em breve chegaram a casa.

Mal entrou em casa e se dirigiram para o quarto, Alberto perguntou:
- Conversaste muito com Diego, um pouco demais até, gostaste dele?
- Gostei, é simpático…

E não disse mais nada, atirou-a para cima da cama, e como se estivesse meio sôfrego, meio louco, ia-lhe dizendo:

-Mas tu és minha, entendes, minha, nada de olhinhos, para cima desses amigos…
-Mas é teu amigo, casado, e eu estou contigo, amo-te, e só estivemos a conversar. Alberto, por favor, porquê isso agora.
- Porque vi os teus olhos e os dele, e tu és minha, entendes, minha?

E Alberto, como que para mostrar esse poder de posse, puxa com violência a roupa de Camila, e sem um acto de carinho ou nada que fizesse prever o que ia acontecer, possui-a por completo como nunca o tinha feito antes.
- Agora não Alberto, estou cansada, por favor, não, assim não, não.
Mas ele não ouvia nada, só estava atento ao que o seu desejo lhe ordenava, e continuava como um lobo faminto.
-És minha, as vezes que eu quiser, quantas vezes eu quiser, como eu quiser, minha, só minha.
- Não Alberto por favor, não, não quero isso assim, agora não...
Mas não adiantou. Alberto estava surdo e meio elouquecido.
Cerrou os olhos com força. Alberto provou-lhe ali que ela era pertença dele.
Camila não queria acreditar, sentia-se violada, desrespeitada. Depois dormia ali a seu lado como se nada tivesse acontecido. Camila não sabia o que estava a acontecer.
Será que teria sido  pouco o tempo de convivio com Alberto? Estar só com Alberto ao fim-de-semana, pensando melhor pode ter sido  pouco para  o ter conhecido correctamente. Estaria certa a sua mãe?

Queria tanto naquele momento ter ali a  mãe, falar com ela, pedir-lhe um conselho, ter o seu apoio, receber dela um carinho. Que saudades tinha de Pia. Mas tinha prometido a si mesma não dizer nada à mãe. Estava desejosa de a abraçar e beijar. De ouvir a sua voz. Nesse momento, pelo menos isso, seria para ela um mimo, um consolo!

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

O novo lar

O voo de regresso foi mais cansativo que o da ida, e ao aterrarem em Madrid, Camila já estava farta daquela viagem que lhe parecia nunca mais ter fim. Voaram em seguida até Zaragoza e depois de carro chegaram até á que seria de futuro o novo lar de Camila e de Alberto, uma vivenda numa quinta na zona de Logroño, que se forma às margens do rio Ebro.

Esta é a capital financeira e comercial de La Rioja, cuja economia é fortemente dependente do vinho. Uma cidade alegre, hospitaleira e amigável. Ainda que o seu clima seja um tanto oscilante indo de temperaturas negativas no Inverno, a temperaturas altas  no Verão.

Ao chegar a Logroño, pelas ruas que percorreu de carro, Camila notou que a cidade tinha prédios novos e modernos, misturados com outros históricos, o que lhe dava um certo charme. Pelo caminho conseguiu observar algumas praças, uma delas parecendo mais um parque cheio de vegetação próprio para caminhadas e quem sabe relaxar. Ficou a saber, porque Alberto lhe disse, que a cidade era famosa pelas mais de 50 taperías (restaurantes de tapas) existentes no centro da cidade. E mais não viu, pois não iria ficar a viver nesta cidade, mas um pouco arredada dela. Foi com alguma pena  que Camila viu esta cidade ficar para trás.

Pararam à entrada de uma quinta numa zona pouco habitacional, de onde se avistavam ao longe vinhedos a perder de vista.
O espaço exterior era bonito, bem cuidado, bem ajardinado, com muitas árvores e recantos floridos, mas naquele momento Camila só queria entrar na sua casa, poisar as malas e depois de olhar o que seria a sua futura casa, tomar um bom banho e descançar. Finalmente com Alberto gostaria de ver tudo detalhadamente para ficar a conhecer bem toda a casa em pormenor.

Ao entrar na casa, que por fora lhe pareceu meio apalaçada, o primeiro olhar que lançou dentro foi de pura decepção. A casa estava decorada com um estilo clássico, muito pesado para ela, aliás, a impressão que dava é que ninguém tinha alterado nada ali, de há muitos anos até aquela altura.  Teriam  limpo o pó, deixando ficar todos os vestígios do passado. Ela não queria viver numa casa com um ar tão austero,  que nada tinha a ver com a sua maneira de ser. Alberto tinha-lhe dito que podia alterar o que quisesse, mas ali teria que alterar tudo, desde os cortinados até à cama que era de um estilo que ela desconhecia.
Camila não se conteve:
-Alberto esta casa é muito bonita, mas não para mim, para nós, a mobília é muito clássica, muito pesada, torna a casa muito escura, não me vou sentir bem aqui dentro, vai-me deprimir, e penso que um dia os nossos filhos também não. Gostava tanto de ter uma casa moderna, ampla onde o sol entrasse, e tudo ficasse muito alegre e iluminado, logo desde o rair do dia.

-Meu amor, esta casa é linda, e  era da minha avó, mas far-te-ei a vontade, como te prometi. Dirás que móveis queres mudar, serão retirados e escolherás outros para o seu lugar, e esses serão arrumados, para o futuro. Andaram a arrumar tudo da melhor forma, mas se as quiseres de outro jeito estás á vontade, só não poderás mexer naquela divisão que era a biblioteca e escritório do meu avô e está fechada. Não tem interesse nenhum. Ouviste? lá não precisa entrar.

Este pormenor intrigou Camila, mas na altura não ligou mais importância a esta questão.

A vontade de Camila era fugir dali para bem longe, distanciar-se daquela casa velha que lhe cheirava a mofo, lhe dava vómitos e a enjoava, e ir morar com Alberto para um andar moderno para  Logoño, mas isso estava fora de questão.
Aquela casa até podia ser uma construção antiga muito valiosa, mas era muito clássica, toda decorada de objectos antiquados, que lhe faziam lembrar a casa de velharias da mãe. Sem querer, estaria sempre a pensar nela, e a vê-la ali estando longe, e isso ia doer-lhe muito, aumentando-lhe as saudades, além de que não era apreciadora daquele tipo de objectos para conviver com eles diáriamente na sua casa. A casa dela não podia ser uma montra de velharias. Parece que tinha recuado no tempo e isso não era o que tinha imaginado para o seu futuro. Tinha que convencer Alberto a ir morar noutro local, se é que alguma vez o iria conseguir. Estava habituada a viver na cidade, e passar a viver naquele sítio, seria só de o imaginar, um tormento, quase uma doença.

Precisava muito falar com Reina, desabafar com ela, pedir-lhe a opinião sobre o que lhe tinha acontecido. Precisava contar-lhe que amava Alberto, que não o queria perder, mas começava a ter medo dele, pois ele tinha sido violento com ela, e isso nunca lhe tinha passado pela cabeça ser possível acontecer.

No jantar de recepção e boas vindas, oferecido pelos pais dos noivos  à sua chegada, estiveram  também presentes os padrinhos de Alberto e Camila. Depois de narrada quase toda a viagem feita pelo Brasil durante o jantar que decorreu animadamente, a certa altura Camila não se sentiu bem. Muito enjoada, mas sem o dizer, alegando imenso cansaço, pediu autorização para se levantar. Todos os presentes incluindo o marido, entenderam que a viagem fora demasiado longa e concluíram que ela podia e devia  retirar-se.

Alberto chegou ao quarto um pouco mais tarde, quando depois de se arranjar Camila se preparava para se deitar, portanto não dera conta da sessão de vómitos que ela tivera mal chegou ao quarto. Todo o jantar tinha vindo parar à rua. Valeu-lhe chegar a tempo à casa de banho, assim ninguém ficou a saber de nada, mas já havia alguns dias que sentia aquele mau estar constante.
Camila desconfiava o que seria, mas  queria ter a certeza para fazer uma surpresa ao marido, no entanto esse era um desejo que não sabia se queria para já.

Camila tinha um marido apaixonado, sedutor,  quem sabe com muitos defeitos escondidos, mas até ali louco por ela. Vê-la assim naquele quarto, em roupa intima, foi o suficiente para se aproximar e começar como era seu hábito por um abraço a envolve-la, e depois com mil caricias e beijos, e tantas meiguices, que Camila perdeu o controlo de tudo e deixando-se cingir naquele doce enlevo, se perdeu de amor como se aquele fosse o ultimo dia da sua vida. Bastava uma mão de Alberto tocar o seu corpo, que ela tremia, e se ele continuasse, a cada toque ela desejava outro, e esse toque fazia-a nesse momento esquecer aquele outro na sua face, mas era só nesse instante. Camila, fora estes momentos que se perdia nos braços fogosos de Alberto nunca mais esqueçeu aquela cena em Angra e seria dificil esquece-la tão fácilmente.

Será que Camila resistiria ao tempo naquela casa velha?

Para a ajudar Camila ia pedir ajuda de Reina.

Nesse dia antes de dormir, já Alberto dormia profundamente, pela primeira vez  antes dela, Camila  telefonou à mãe. Tinha saudades de Pia. Nas férias tinha falado duas vezes com ela, só para mandar beijinhos e Pia dizia-lhe sempre o mesmo"estou bem, não te preocupes, diverte-te", apesar de Camila sentir que avoz da mãe já não era a mesma de outrora. Naquela hora apesar de ainda à pouco Alberto a ter coberto de caricias, algo nela  estava imcompleto.
Precisava ouvir a voz da mãe. Se pudesse naquela hora o que lhe saberia melhor era falar com ela, pousar a sua cabeça no seu regaço contar-lhe os seus problemas, e sentir os afagos que a mãe lhe costumava fazer no seu cabelo, quando era mais miúda. Mas nunca contaria à mãe o que se passava com ela, não iria preocupá-la  com os seus problemas.

 Quando conversava com a mãe, sentia sempre que existia entre elas uma grande cumplicidade, parecia que se reconheciam pela voz, que se  conheciam pela entoação das palavras.
Teria que disfarçar a voz, colocar uma voz doce, dizer que tudo estava bem, que em breve juntamente com o Alberto iriam visitá-la, mas primeiro estava a tentar convencer Reina a visitá-la no Norte.
Estavam ambas bem de saúde, deram-se os beijos do costume e as boas-noites, foi o que Camila, concluiu.
Agora Camila iria dormir mais tranquila.


Nunca iria preocupar a mãe com os seus problemas, a ela que tanto amava e a prevenira da sua precipitação, isso era ponto assente.



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domingo, 28 de novembro de 2010

Porquê?

Desde criança sonhara conhecer aquelas terras, aquele país, também conhecido por Terra de Vera Cruz, como lhe chamam os Portugueses, onde as pessoas se sentem livres e soltas, passeiam de chinelo no pé, têm um sorriso aberto, parecendo sempre contentes com a vida, mesmo quando tudo corre mal, com um sotaque que lhe dava prazer ouvir. O ar têm um cheiro a terra  quente e húmida, muito diferente do cheiro seu país.
 Mal desceu do avião e sentiu esse ar no rosto, adorou-o. Era a  viagem ao Brasil, país tão bem escrito por Jorge Amado e  tao bem cantado por tantos cantores famosos, como Vinicius de Morais, Elis Regina, Caetano Veloso e tantos outros. Estava a viver o sonho da sua vida, com o seu amor.

O roteiro estava delineado, e ao começar pelo Rio de Janeiro, não deixaram nada por ver, Niterói, estádio de Maracanã (que lhes mereceu uma visita pelo mítico jogador Pelé), Pão de Açúcar, Corcovado, onde Jesus parece abraçar o Rio, e com ele o mundo inteiro. Camila estava deslumbrada. Nestes últimos locais, sentia-se no topo do mundo. Nunca tinha visto tamanha beleza. Dali, tudo parecia perfeito, a natureza era maravilhosa e o seu amor ali, era pleno e absoluto. Parecia-lhe que dali conseguia dominar todas as coisas, ter o mundo a seus pés. Sentiu-se completamente realizada. Com Alberto visitou Ipanema, passeou em Copacabana  no calçadão, misturando-se com os brasileiros, com uma roupa bem simples, sem ter tido problema algum,  sentiu-se com o povo, uma mulher realizada.

Foram até Búzios três dias, e num passeio de barco que fizeram para conhecer todas as pequenas praias de Búzios, conheceram um casal simpático, com quem travaram um convívio mais chegado, pois como eles iriam em seguida para o mesmo resort fazer uma semana de férias, em Angra dos Reis.

As praias de Búzios eram deliciosas. As suas águas quentes e calmas, e logo ali ao lado as palmeiras e toda a vegetação verde que parecia beijar o mar, encantavam Camila que não parava de tirar fotos. Em cada recanto uma praia um tanto diferente, parecendo que alguém as tinha andado ali a distribuir, como se estivessem entre o polegar e o indicador de uma enorme mão gigante, com pequenos areais rodeadas de vegetação tropical luxuriante, sem se saber dizer muito bem qual seria a mais bonita e aconchegante.
Passaram ali dias ildilicos a não esquecer. Dias de sol, praia, diversão noturna, compras nas lojinhas, contacto com o povo, visita a locais vizinhos.
Tinham decidido, antes do fim de férias, ficar uma semana em Angra dos Reis, a apanhar sol, relaxar, tomar banhos de mar, a passear entre os verdes maravilhosos dos jardins junto ao mar, a tomar uma bebida ao entardecer junto à piscina, a inventar amor no seu quarto depois do pôr-do-sol, que ali se põe  muito cedo, a darem-se mil beijos sempre diferentes, que aquele clima convidada todo tempo ao aconchego e ao mimo mútuo, e também a conversarem, mas a estarem sós os dois, pois quando regressassem Camila sabia que Alberto com o trabalho estaria muitas vezes ausente de casa, e a deixaria muito tempo só.

Em Angra dos Reis o tratamento no resort era fabuloso. Tudo tinha muito requinte tendo em conta que se estava junto ao mar. A decoração era cuidada ao pormenor, ao mesmo tempo que era simples, era de um gosto extraordinário. Se Camila pudesse ficaria ali para sempre. Identificava-se com aquela gente simples que trabalhava no resort, o seu falar cantante, o seu sorriso permanente, sempre alegres e dispostos e com tempo para tudo, parecendo que para eles o relógio tinha muitos mais minutos. Ali sentia-se tratada como uma rainha.

Num dos passeios de barco que fizeram com o casal amigo, enquanto as esposas, Camila e a outra, nadavam e procuravam observar uns peixes no mar, os maridos no barco bebendo uma caipirinha, combinavam um desvio que não estava no programa, que estava a deixar Alberto eufórico de entusiasmo.

Ao subir para o barco, Camila só ouviu Alberto dizer:

-Mas com certeza que vamos, a reserva vou fazê-la logo que ao resort no balcão e iremos juntos, ok?
-Mas vamos onde amor, não me contas ?-perguntou Camila.
-Claro, falaremos mais tarde no nosso quarto, agora vamos  preparar-nos para sair do barco, que estou cheio de fome. Tu não? Que tal almoçarmos juntos?

E foram todos almoçar, num restaurante simpático na principal rua de Buzios.

Quando chegaram ao quarto Camila quis logo saber o que era aquilo a que se referia Alberto no barco, de estar a dizer que iam sair.

-Vamos sair a jantar a algum lado com aquele casal? Gosto de passar o serão contigo, ainda agora almoçamos juntos, e aqui fazem animações tão divertidas ao jantar, depois ando cansada quero deitar-me cedo.

E Camila ia-se despindo, preparando-se para tomar um duche, e depois relaxar um pouco sobre a cama, como era hábito dela e de Alberto, antes do jantar.

- Nada disso, eles vão visitar Salvador da Baia, e eu resolvi que nós também iriamos com eles. Vou comprar as passagens de avião para irmos amanhã para a Baia, e depois peço a alteração do nosso voo e embarcamos em Salvador da Baia, para regressarmos a Espanha, em vez de embarcarmos no Rio. Acho uma ideia fascinante ficarmos a conhecer a Baía, tu não? Não me digas que estás do contra que me irritas.

-Percebo, mas não concordo. Acho que me devias ter pedido a opinião. É tudo muito precipitado, Estou cansada, e penso que devias ter-me consultado. Alberto depois voltariamos ao Brasil a fazer essa viagem, ou então decidiamos agora os dois o que fazer, não ias já com os papéis resolver tudo sem práticamente me dizer nada.
-Mas não estou a dizer.
Camila não teve tempo para falar mais nada, Alberto estava com uns papéis numa mão, provavelmente para ir comprar os bilhetes como tinha dito, mas ao sentir-se contrariado, sem Camila conseguir entender como, ele esticou um  braço e com a mão deu-lhe um empurrão e uma bofetada voou pelo ar e assentou no seu rosto com tanta rapidez, como ela nunca tinha levado outra, que ela caiu na cama meio nua, enquanto ele saía dizendo:

-Quer só fazer o que lhe apetece, aborrecida- E saiu precipitadamente.

Camila estava trémula, confusa e admirada.não sabia se chorar se gritar. fugir era o que queria mas não tinha para onde. Aquilo não podia estar a acontecer com ela. Alberto acabava de lhe dar um safanão e uma valente bofetada porque ela não concordava com uma coisa que ele decidira sozinho, e agora nem queria ouvir a sua opinião?Ele não tinha motivos para fazer o que acabara de fazer, mas nada poderia justificar aquela violência. Camilla desconhecia completamente aquele Alberto, aquela voz, aquele olhar, aquela mão que a tocou. E ela pensava isto lavada em lágrimas. O rosto ardia-lhe de dor e mágoa.
Estava cansada, não queria mais mudanças. Gostava tanto de estar ali, só com ele, não com outro casal. Noutra ocasião visitariam Salvador da Baia, pois ela gostaria de voltar mais vezes ao Brasil. Nada justificava a atitude do marido. E muito encolhida, no mesmo quarto onde já se sentira a mulher mais feliz do mundo, naquele momento, chorava como nunca tinha chorado antes, nem mesmo quando perdera o seu pai.

Como seria possível, ela nunca se ter apercebido daquele olhar, e daquela raiva, no Alberto por quem se enamorou?

E estava com estes pensamentos a martelarem-lhe na cabeça,  num choro e soluçar profundo e sentido, que não se apercebeu que Alberto entrou, e já lhe afagava os cabelos, lhe acariciava os braços, e a envolvia lentamente. E ela carente e porque o amava,  ao poder sedutor do marido que também a amava, deixou-se seduzir, porque lhe sabia bem o afago daquelas mãos macias e o calor daquela voz quente que lhe sussurava ao ouvido e a fazia estremecer de prazer.

-Perdoa-me, não sei que me deu, fiquei fora de mim,por não me estares a entender.  Não sou assim tu sabes, amo-te tanto, quero-te muito, és a minha mulherzinha querida, não posso viver sem ti, diz que me perdoas, diz? Perdoas-me, vá diz que me perdoas.

E envolveu Camila com tanto beijo e tanto afago, que ela devagar se acalmou, deixou soluçar, de pensar, e correspondeu plenamente a todas as caricias e meiguiçes que ele lhe fazia docemente, sem se furtar a nenhuma, e os dois num só, amaram-se como se anteriormente nada ali tivesse acontecido.

Camila dormiu nos braços de Alberto e quando acordou, as malas estavam feitas. Ele tinha preparado tudo.

-Vê amor como está tudo preparado. Agora toma um duche, vamos tomar o pequeno-almoço, apanhar o táxi com os nossos amigos e tomar o avião. Podes levar uma roupa bem à vontade. Sabes, amo-te, adoro-te, e beijou-a vezes sem conta.

Camila tinha  tido uma noite maravilhosa com o marido, pois não conseguia resistir-lhe nunca. Amava-o acima de tudo, mas não esquecera aquela bofetada que ele lhe dera, a força que usara, e o seu olhar naquele momento. Aquela mão tão diferente no toque ao tocar-lhe o rosto ficara gravada na sua memória e no seu coração. Dispensava uma recordação dessas da sua lua-de-mel.  O facto de Alberto a ter deixado e ter feito prevalecer a sua vontade mostrara-lhe um lado dele que ela não conhecia. Adorava aquele homem que a conseguia levar até às nuvens, colocava-a no céu, mas depois daquele fim de tarde, tinha que passar a controlar-se. Ele dominava-a completamente.

Teria que viajar para Salvador da Baia sem saber nada daquela viagem, sem ter planeado nada com o marido como era habitual, situação com que ela não concordava. Seriam dois dias, ou três, ela nem sabia ao certo, diferentes dos que sonhara, sempre acompanhada de um outro casal, sem conseguir apagar da sua memória aquela mão de Alberto a cair na sua face, onde sentia ainda um fogo. Seriam dias de mentira, de faz de conta. Um final de lua-de-mel que lhe ficaria na sua memória como um marco feio, triste e nebuloso.

Nada a faria esquecer aquele final de tarde em Angra dos Reis. Por mais beijos e caricias que Alberto lhe desse, todos seriam poucos para limpar aquela mancha.

Alberto continuava a sorrir e a divertir-se naquela que deveria ser a viagem de sonho de ambos, mas se o azul dos olhos de Camila já tinha escurecido quando saiu de Múrcia, agora tinha perdido um pouco do seu brilho.


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quarta-feira, 24 de novembro de 2010

A despedida

Com as malas feitas e preparados para viajar era a primeira vez que Camila parava para se questionar.
Por alguns segundos pensou se não se teria precipitado. Todo aquele tempo, quase dois anos, passara tão depressa que nem um segundo agira com a razão, tinha sido sempre levada pela paixão que sentia por Alberto. Sentia-se possuída por um amor que lhe era prazenteiro, mas que quase não a deixava raciocinar, nem viver, nem respirar, e só agora que deixava as suas raízes, dava conta que isso lhe trazia algum desconforto e insegurança.

Chegara a hora de abandonar aquela casa onde sempre vivera desde menina com os pais e Giulia, e dava-se agora conta do peso e mágoa que ao sair dali, isso lhe causava. Ainda não tivera tempo para pensar, porque talvez por medo, não se dera ao trabalho de o fazer. Quisera evitar fazê-lo, quem sabe inconscientemente, com receio da resposta, ou de algum pequeno vacilo, que o seu coração lhe poderia dar.
Não queria perder Alberto por nada, pois estava deveras apaixonada, e via agora que a sua precipitação naquele abandono drástico lhe ia ser doloroso. Estava presente em todas aquelas coisas que fizeram parte da sua vida,  para poder deixá-las assim sem sentir mágoa, mas era tarde e não podia recuar.

Semeara tantos sonhos e colhera tudo o que desejara, sem saber ainda se a colheita seria produtiva e positiva de verdade.

Ia abandonar a sua cidade, os seus amigos, o trabalho onde poderia continuar e executaruma função, as praias que costumava vesitar nas redondezas, o mar de Múrcia, a praça  sempre cheia de flores, os bares e outros locais que visitou tantas vezes com os amigos, e mais tarde com Alberto, mas mais importante que isso, ia deixar a loja de antiguidades e a casa onde nascera e fora criada com todo o amor pelos pais, onde aprendera a amar e ser amada como só eles sabiam amar, a entender e ouvir como eles, e tudo isso durante toda a sua vida, e agora que era mulher e ia partir ao recordar tudo isso, sentia uma amargura infinita que não conseguia explicar.
Tentou ocultar dentro de si esse sentimento que devia ser visivel no seu rosto, de forma que Alberto não se apercebesse.
 Mas na verdade, ele não se apercebeu das suas preocupações, pois estava eufórico com a viagem.

Deixar a mãe sozinha, ainda que esta ficasse com a velha Giullia, agora que chegara a hora de partir, causava-lhe uma tristeza e um transtorno infinito, acrescido pelo facto de Pia lhe afirmar que raramente a iria visitar a Rioja, por não gostar da família de Alberto, e também por não lhe apetecer viajar por sentir a falta de Geraldo. Tudo isto lhe causava uma sensação de abandono e solidão, como se ao sair dali algo dentro dela morresse um pouco para sempre. Sentia como se estivesse a ser despojada, deitada para fora de algo que lhe pertencia e nunca mais seria dela, ainda que neste caso fosse ela própria que se despojasse a si mesmo.
Era como uma auto flagelação a que Camila se submetia naquele momento que partia, mas à qual haveria de resistir, pois esperava ser feliz com Alberto a ponto de se compensar de todas essas lacunas. Pensava falar muitas vezes com a mãe e visitá-la as vezes necessárias para matar saudades e resolver algum assunto que fosse necessário, mas ao final daquele dia ao contrário do que imaginara estava abalada e triste.

E Alberto pensando que aquela angustia e ansiedade eram provavelmente derivadas da longa viagem que os esperava, nem fez perguntas acerca da sua saída daquela casa, e a alguma variação possível do estado de espírito da sua mulher, não referiu absolutamente nada. Despediu-se de Pia como de costume, e nem reparou, que depois daquele longo abraço que a mãe e filha deram, o rosto de Camila mudou, os seus olhos azuis ficaram mais escuros.
Pia estava uma mulher mais triste e fria desde que Geraldo morrera, e isso acentuava-se desde que Camila pensara em se casar, mas evitava fazer muitos comentários pois não queria intervir na vontade da filha . Todo aquele tempo chorara para dentro o facto de ver a filha partir tão depressa, mas depois de se despedirem, não se conteve mais e os seus olhos choraram até secar as lágrimas.
Jurou que nunca mais choraria por nada, nem ninguém. O seu coração de mãe dizia-lhe que tinha perdido a sua menina, por mais que Giullia lhe dissesse que estava errada, ela não pensava noutra coisa, algo lhe dizia que Camila não estava a dar o passo certo. Mas seria decerto um pouco de ciume, era e sentimento de perda era o que dizia Giullia. E ficou pora aí.
Só Camila bem no fundo do seu coração, sabia que não era por causa do receio da viagem, mas porque perdera naquele instante o colo da sua mãe e o carinho de Giullia, que os seus olhos tinham ficado para sempre de um azul mais escuro.

Múrcia era uma página virada na história da sua vida, e naquele momento, ela dera-se conta que poderia estar a fazer aquela viagem ainda solteira, quem sabe com o Alberto, ou outros amigos, mas com mais calma, sem ter que se afastar tão rapidamente da sua cidade e da mãe que estava a passar uma fase terrível na vida. Estava feliz, mas ao mesmo tempo, incompleta e plena, havia qualquer coisa que falhara e que ela não se dera conta, tão envolvida que estava com a sua paixão.

Esperava nunca vir a arrepender-se daquele casamento tão apressado, como lhe disse muitas vezes a mãe e Reina. Desejava muito que Alberto a merecesse, pois a sua única certeza que tinha era o seu amor infindo por ele, e sobretudo esperava que a mãe um dia a perdoasse.

Precisava partir com Alberto. Um avião esperva por ela e pelo marido para juntos voarem, até à América do Sul. Quando voltasse um dia a Murcia não seria a mesma mulher, e se por um lado isso a entristecia, por outro enchia-a de muito orgulho. Estava orgulhosa por passar ao rol das mulheres casadas. Seria a senhora Velasquez.

Desde menina que desejava conhecer um pouco do Brasil, tinha a certeza que com o marido faria uma viagem de sonho.

Agora precisava pôr de lado todos aqueles pensamentos que lhe ensombravam o espirito e aproveitar ao máximo os dias que se avizinhavam e que começavam ali.

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terça-feira, 23 de novembro de 2010

O casamento(A Mantilha)

O casamento seria na Primavera, no Santuário de La Fuensanta.
Gradualmente com a ajuda de Reina que aceitou maravilhada ser a madrinha de Camila, tudo começou a ficar em ordem. Ambas começaram a trabalhar afincadamente para nada falhar no dia da cerimónia.
Contratado o local da boda, escolhido o menu e a decoração da sala, falaram ao fotógrafo, e à florista que haveria de enfeitar tanto o Santuário como o local da boda. Mais tarde asseguraram  o transporte de todos os convidados para o Santuário e de volta ao local da boda. Camila  escolheu as ofertas para os convidados, tratou de mais alguns pormenores e em seguida com Reina resolveu dedicar-se à escolha do seu próprio vestido. Ambas estavam excitadissimas, pois esse era o momento alto de todo o trabalho que tinham que fazer.

“O vestido de noiva, os sapatos, o toucado, o cabeleireiro, o vestido da menina das alianças, o vestido de Pia, o vestido de Reina que era a madrinha, as alianças que Camila escolheria com Alberto, ainda que fosse este a pagar, e o seu bouquet, tudo reliquias adquiridas em momentos que Camila esperava memorizar eternamente como sendo uma das melhores fases da sua vida, ainda que ensombradas infelizmente pela perda do pai.
O seu vestido era em tudo semelhante ao que levara ao baile de gala. Queria muito que Alberto a voltasse a olhar daquela forma, como na noite em que o vira naquele canto da sala e se conheceram.
Queria deslumbra-lo constantemente.

Com um decote destinto, um imponente cai-cai deixava-lhe os belos ombros desnudados, a saia com muito volume até baixo, corte envase, cheia de folhos, e uma cauda de sereia  realçando-lhe as curvas, e toda a silhueta de forma que a tornava mais formosa que qualquer princesa que tivesse casado algum dia, Camila ficava mais bela que alguma vez estivera, o seu corpo ficava mais esbelto que nunca.
Alberto ficaria com certeza fascinado e orgulhoso com a sua esposa.

Quando o provou, Reina adorou vê-la. Faria uma noiva ousada e diferente, mas por isso mais bela ainda.     
Estava radiosa de tanta felicidade.
Sobre o rosto Camila iria levar uma mantilha que já sua mãe tinha usado, como era tradição algumas noivas usarem em Espanha. O cabelo ia apanhá-lo, num toque de candura e sofisticação, deixando-o parcialmente preso se possível. Pediria ao cabeleireiro que lhe fizesse um ligeiro tufado, criado na nuca, para com um retoque especial lhe colocar aí, uma travessa de pérolas e cristais que também era herança da mãe. Por cima desse arranjo do cabelo levaria a mantilha, que na devida altura Alberto lhe retiraria de sobre os olhos com um beijo quando já fosse sua mulher.
 Camila pensava em todos estes pormenores com imenso carinho, e sabia como tudo seria muito mais intenso e vivido se o pai estivesse ali com ela e com a mãe.

Para a mãe escolheu um vestido comprido azul-marinho, corte linha princesa que lhe assentava bem, em que o tecido era todo lavrado, e uma echarpe  no mesmo tom, tal como os sapatos. Pia queria ir muito discreta, e quando provou o vestido concordou com a escolha.
A menina das alianças era uma miniatura de Camila, um encanto. Era uma menina linda de seis anos, sobrinha de Reina e de Julio.

E porque o tempo não pára, mesmo contrariando a vontade de Pia, o dia do casamento chegou. Pia não acredita que a filha vá ser feliz afastando-se tanto daquela cidade onde cresceu, da vista do mar e das praias, abandonando todos os seus amigos, e o pior, decidir não trabalhar no futuro, uma coisa que ela sempre desejou fazer toda a vida, despegando-se dos seus hábitos, e dela que era a sua mãe. Será que se o pai fosse vivo, agiria da mesma forma?

Não imaginava como iria conseguir viver longe da filha, mas teria de ser forte e resistir a essa distância. Para ela a filha estava a dar um passo precipitado, mas não queria separá-los e ser ela a causadora de um ponto de discórdia ou desunião. Conhecia o temperamento da filha para imaginar que não ia ser fácil  ela adaptar-se a uma família que mal conhecia. O tempo é que lhe daria ou não razão, e ela esperava ter que engolir todos aqueles pensamentos como falsos, para bem da sua filha única de quem só queria a felicidade. Um dia queria arrepender-se de todos estes pensamentos loucos, por isso não os contava a ninguém.

Enquanto tivesse Giullia, a sua velha ama e amiga, para lhe fazer companhia, ficaria bem, se no Norte a filha estivesse bem, melhor ainda.

Naquele dia Camila estava deslumbrante. Tudo estava lindo, nas suas mãos o seu bouquet traduzia o que ela desejava que aquele dia transmitisse a todos, muita alegria, muita satisfação e felicidade. Um ramo de pequenos jarros brancos, flor discreta símbolo de beleza e elegância, e rosas de um amarelo quase coral muito claro, o que tornava o bouquet encantadoramente sofisticado.
No casamento tal como imaginara, Alberto delicadamente levantou  a mantilha que lhe encobria os olhos e lhe deixou a descoberto não só o olhar feliz e radioso, como a travessa lindissima que tinha no seu penteado, e deu-lhe um beijo na testa, prometendo-lhe peramte todos ser-lhe fiel, amá-la, respeitá-la, ser ser amigo e companheiro nos bons e maus momentos até que a morte os separasse.
No se dedo anelar da mão esquerda tal como na de Alberto, uma aliança que ambos trocaram, significava também que ambos juraram  fidelidade eterna, amor e companheirismo, em todos os momentos das suas vidas. Na mão de Camila junto da aliança ela juntou o seu anel de noivado.

Nesse dia tudo decorreu como sonhara, tanto na igreja como na boda, como em todos os cantos e recantos por onde andou com Alberto, ambicionando uma dualidade de desejos:

“ Que esse dia fosse tão longo  que não tivesse  fim, ou se possível que perdurasse para sempre”.

Aparentemente naquele dia todos pareciam felizes e até Pia conseguiu sorrir algumas vezes, ainda que o seu coração estivesse triste e distante como nunca. Num ano só, a sua vida dera uma volta e modificara completamente. Também naquele dia jurara a si mesmo ficar em Múrcia, e ir no mínimo a Rioja aborrecer ou visitar a filha. Pelo pouco contacto que teve com os familiares mais chegados de Alberto, não se identificou muito com eles, não criando com eles grande empatia. Olhavam-na de alto a baixo, examinando ao pormenor tudo o que dizia e fazia (era o que lhe parecia). Quase que se sentia despida por aquela gente, e naquela fase da sua vida, queria paz, esses procedimentos incomodavam-na. A filha teria que lhe perdoar, mas ela não iria suportar essa gente.

Teria que enfrentar o futuro. Geraldo sabia que ela era uma vencedora. Algures onde estava iria apoiá-la.

A Camila, esperava-a uma viagem maravilhosa até o Brasil, e no regresso, uma nova casa, a sua casa em Rioja, e uma família diferente.




Fotos retiradas do Google