segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

O nascimento de MARIA

Cheia de dores, Isabel não fazia dilatação alguma. Pedro a seu lado já via a cabeça do bebé, que teimava em não querer descer pois não tinha espaço. E o médico não aparecia. Isabel aguentava as dores, que não eram nada fáceis de suportar e se sobrepunham umas às outras, sem lhe dar tempo para respirar. Esteve assim desde segunda-feira de manhã bem cedo, até terça de manhã. Às sete da manhã como o bebé não descia mais e Isabel não aguenta mais dores, aparece o médico pronto para lhe fazer um parto por ventosa. Sempre a seu lado, Pedro apoia-a e assiste ao lado de Isabel ao parto do filho.

-Não faça força, só quando eu disser- e Isabel encolhia-se cheia de dores, o mais que podia para o seu filho sair ileso, e não sofrer qualquer dano.

-Pode fazer agora toda a força que puder-dizia de novo o médico, e esta situação repetiu-se algumas vezes até que de repente, Isabel sentiu um choro de bebé e Pedro disse:

-Já está, é um menino, pois olhou-o com o cordão umbilical.

-É perfeito-pergunta Isabel a Pedro que se encontra do lado dela, ao que ele responde que sim. Mas o médico pergunta-lhe:

-Então o que tem a senhora lá em casa?

-Tenho um menino senhor doutor.

-Muito bem, então tem aqui agora uma menina.

Isabel comovida só disse:

-A minha “MARIA”, obrigada Senhor.

E o médico mandou que a enfermeira coloca-se a menina sobre o peito de Isabel, que ali ficou algum tempo enquanto o médico lhe cosia o enorme corte que lhe tivera feito para conseguir tirar Maria com a ventosa pois Isabel não dilatava. Pedro estava tão feliz que não cabia nele de contente.
Desejava muito ter uma filha, e abraçou Isabel, tão emocionado como nunca o fizera, de forma que quase a atirara da maca a baixo. Maria continuava deitada no peito da mãe e Isabel jamais esquecerá esse contacto, esse cheiro, essa magia que se criou entre ambas, esse elo maravilhoso, que se pudesse devia ser eternizado e nunca mais devia ser desfeito por nada.



Há fenómenos que acontecem que se deviam perpetuar eternamente, permanecer ilesos, como actos vivos que nunca morrem e que ficam para sempre para nos ajudar a viver, a amar, a suportar as coisas piores da vida, para não nos esquecermos que nos dias que temos dores e nos sentimos derrotados,  também tivemos dias em que fomos extraordinariamente felizes.

 
 
 
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sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Dois anos com Manuel

Manuel nasceu em Dezembro de 1979, e nesse ano esse foi o melhor presente de Natal. Nessa altura a sala do casal já tinha os sofás e uma mesinha de vidro, muito simples mas estava pronta para receber o menino. Na noite de Natal como de costume, o Manuel lá foi na sua alcofinha visitar os avós, mas depressa porque era pequenino e tinha que vir para casa que a noite fria não o queria pela rua.
Na passagem de ano, Isabel e Pedro na pequena mesa de vidro colocaram bolo-rei, passas, espumante, e com a alcofinha ao lado brindaram ao novo ano, a 1980, e á saúde de Manuel, para que ele crescesse com muita saúde e força, que para susto bastou o que passaram antes de ele nascer. Não sei garantir este pormenor tão importante, pois ela não me referiu, mas suponho que esta terá sido uma das melhores passagens de ano da vida de Isabel.
A doçura de um presépio real, à volta de uma mesa singela de vidro. Sentados no chão de pernas cruzadas, o Pedro e Isabel, e ao lado o Manuel na alcofa a dormir, lá fora um frio intenso mas um céu estrelado, e ao cair das doze badaladas os copos não tilintaram pois não eram de cristal, mas ambos os ergueram e fizeram votos de saúde e longevidade para si e para o seu filho lindo, que dormia ali ao lado. Por curioso que pareça por mais trinta anos, e outros tantos que venham, sempre que Isabel no dia de mudança de ano olha para o céu lembra este momento único, com imensa doçura e alguma nostalgia.
Aqueles dois anos que se seguiram foram intensamente vividos para aquele filho, tanto por Isabel como por Pedro.
Dizer que foi fácil não foi, mas aquele era um sonho tão desejado que Isabel esqueceu tudo o resto e dedicou-se completamente ao seu papel de mãe. Tudo era feito e pensado em função de Manuel, que parece que adivinhava tudo o que se pretendia dele. Dormia nas horas necessárias, comia as papas quando a mãe lhas dava e logo que o médico disse que estava na hora de começar a iniciar-se nas refeições dos pais Isabel assim fez, e Manuel gostou do sabor do arroz e do peixe e de tudo o resto.

Manuel parece que entendia o que o médico dizia. Isabel preparava a comida de acordo com as instruções do médico de forma que o filho pudesse comer, e sofregamente, ele comia agradavelmente a comida que ela lhe preparava. Difícil era mantê-lo calmo até a refeição acabar, pois tinha grande apetência para a colher, e quando se via sem ela na boca logo tinha outra que entrar.

As idas ao pediatra com Manuel ao colo não foram fáceis, pois eram longas tardes de espera até de noite para medir e pesar o bebé, ver se tudo estava bem, para depois voltar para a aldeia de comboio com ele ao colo. Como ele nasceu em Dezembro, os dias eram curtos e frios e Isabel carregada, chegava cansada e muito tarde a casa. Sozinha, porque Pedro que ainda não trabalhava fora, ficava no seu local de trabalho, e não podia ir com ela, aguentava com o peso do filho, fraldas que lhe ia mudando durante o dia e mais tarde suplementos de leite porque o seu começou a não ser o suficiente a partir do meio ano de idade. À noite ao chegar a casa vinda do pediatra da cidade, as suas costas doíam, mas havia que cuidar do banho do filho, fazer o jantar, e depois cuidar dela para descansar, que de manhã bem cedo o Manuel também mamava e depois um novo dia de trabalho começava.
Que para Isabel não houve dias de descanso de parto, como nos tempos actuais, depois do Manuel nascer logo que pode começou gradualmente a trabalhar.
O que mais constringia Isabel, era ter que dar mama ao filho no comboio, que por ser comilão não esperava para chegar a casa para comer. Respeitava rigorosamente os seus horários de refeição e assim muitas vezes, ela teve que o amamentar nessas viagens que fazia vinda do pediatra, antes de chegar a casa e os homens
continuavam os mesmos, pareciam que nunca tinham visto, apesar de ela se proteger (...)




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O nascimento de MANUEL

Quando o Manuel nasceu, Isabel sentiu-se a mulher mais feliz do mundo. No final do parto Isabel não ficou muito bem, pois antes passou por uma grande angústia, visto que a vida do bebé esteve em risco. O médico prevendo que tinha chegado a hora do bebé nascer, colocou-a a soro o que provocou o enrolar do cordão umbilical à volta pescoço do bebé dentro do ventre de Isabel, de forma que a certa altura se deixou de ouvir. Rapidamente tiveram que ser providenciadas todas as medidas para que o parto fosse provocado e se pudesse salvar uma criança que durante nove meses não causara, nem tivera, quaisquer problemas de maior durante a gestação.
 Estava instalada a confusão na maternidade, Isabel tinha rapidamente que ser submetida a uma cesariana, pois os batimentos cardíacos do bebé já não se ouviam. E o mais grave, é que não encontravam anestesista. Isabel nervosa com tanta gente à sua volta nem sabia como respirar, e nem percebia bem o que se passava mas o seu coração de mãe dizia-lhe que o filho estava em risco. Fez tudo o que lhe disseram, esqueceu as suas ânsias e pediu a ajuda a Deus, que ela soube esteve sempre presente. E tudo teve um bom desfecho. O anestesista apareceu, o Manuel saiu ileso do ventre da mãe e ainda que o seu pescoço durante muito tempo permanecesse vermelho, estava vivo e cheio de saúde. Isabel um dia contou-me, como muitas outras coisas que me revelou ao longo da sua vida, que não esquece os comentários das pessoas que nos corredores da maternidade a viram passar de maca para a sala de operações, dizendo umas para as outras:

-Então é esta, coitada, vamos ver se o bebé se safa.

Decerto todos deviam saber, por escutarem os comentários das enfermeiras, que o Manuel estava em perigo, mas felizmente escapou ileso, e tal como o médico disse e ela bem ouviu, era uma pena perder-se, porque era um rapagão, um bebé forte e rijo, cheio de saúde com o peso certo e tudo em ordem para crescer e dar um belo homem no futuro.

Sempre que as enfermeiras pegavam nele para lhe dar banho ela ia atrás. O seu filho era o mais bonito, o maior e mais perfeito de todos, claro era o seu bebé, e ela a sua mãe. Isabel estava louca para chegar a casa e tratar sozinha daquele menino que ela criara dentro dela durante nove meses e que já amava com todo o amor do mundo. Ninguém nunca seria capaz de cuidar tão bem dele como ela. Depois de dez dias de internamento, saiu vaidosa da maternidade para a sua pequena casa, orgulhosa com o Manuel deitado na sua alcofinha, que o Pedro carregava com mil cuidados. Isabel ainda se movimentava mal, mas cheia de vontade depois de chegar a casa, que nesse dia valorizou como se fosse a melhor de todas as casas, cuidou do seu menino o melhor que soube e pode. Deu-lhe banho, mama, mudou fraldas claro, várias vezes que nesse tempo eram de pano, e deitou-o a dormir, sempre curvada, pois na sua barriga ainda estavam alguns dos pontos da cesariana, e o corte tinha sido grande e estava bastante colóide.

O Manuel mamava e dormia muito bem. Era um bebé tranquilo, que dava vontade de cuidar, ou então era o jeito de Isabel e a sua agilidade para o fazer. Não lhe faltaram as consultas necessárias e os respectivos conselhos médicos para que o filho crescesse sem nada lhe faltar, mas cuidados maternais esses é que nunca lhe faltaram, e nunca foi preciso pedir ajuda a este ou aquele para lhe dar banho ou fazer fosse o que fosse, Isabela assumiu sozinha e integralmente esse trabalho juntando-o ao seu trabalho profissional o que naturalmente muitas vezes se tornou algo penoso e difícil, mas sem ela nunca fazer grande contestação.

Mas com a ajuda de Pedro não foi difícil conciliar ambas as áreas e despojando-se da vida social do convívio de amigos, Isabel, entregava-se a cuidar do filho em primeiro lugar, depois da casa e de Pedro e depois ou em igual plano do trabalho. Isabel era mãe, e isso enchia o seu coração de felicidade, mas como tinha feito uma cesariana, muito baixinho para ela mesmo, para ninguém ouvir, muitas vezes pensava:

-Não sei ainda, como é ter um filho. Tive tanta dor no pós parto por causa da contracção do útero, custou-me tanto a cicatrização dos pontos, mais de vinte, do corte que me fizeram alto a baixo apanhando toda a minha barriga até ao umbigo, passei tanta aflição com medo que o Manuel morresse, e não sei como é exactamente a dor de um parto, por causa de uma teimosia do médico que me colocou a soro porque achou que estava na hora do Manuel nascer, porque a minha barriga estava grande e o obstetra dizia que eu me devia ter enganado no tempo, sabendo eu tão bem que tinha engravidado naquele dia de Março, exactamente naquele dia (…)

E pensava estas coisas com uma vontade enorme de voltar a engravidar e ter outro filho, logo que passasse o prazo que o médico lhe deu sobre a cesariana, porque Isabel queria saber como era ter um filho de parto normal, e havia de se chamar Maria. Sentir nascer um filho, vê-lo nascer e poder estar com ele logo ali, junto dela, na hora em que depois de sair de dentro dela o médico lho colocasse sobre o peito. Com o Manuel, como estava sob o efeito da anestesia, só mais tarde teve oportunidade de o olhar e ver o seu rosto. O maroto, inteligente, chegou muito mais cedo ao quarto do que ela e quando esta regressou, ele já muito bem instalado dormia o seu primeiro sono neste mundo terreno onde minutos antes, cerca de quarenta e cinco, tinha aterrado pronto para enfrentar o bem e o mal, que para isso e muito mais é que e Isabel e Pedro o iriam educar.

Um dos sonhos de Isabel estava concretizado. Isabel era mãe, e poderia cuidar do filho de forma que ele crescesse saudável e robusto, feliz e tranquilo. Iria dar-lhe tudo o que ele precisasse para se sentir uma criança calma e equilibrada, e sobretudo iria amá-lo muito para toda a vida, que o amor de mãe nunca se esgota. Os seus problemas porque os tinha, ia evitar que o filho os percebesse e alterassem ou modificassem o crescimento tranquilo do seu dia-a-dia dentro do possível. Manuel era uma criança e tinha direito a crescer como tal, com todos os direitos que lhe eram assistidos.
E assim foi sempre.


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terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Ao meu Lado

E ali ao meu lado tudo corre como sempre.

Tudo parece perfeito.

É como se tudo fosse como um porto exacto.

Mas um cais fechado e abandonado.

Um porto sem-abrigo, onde não há barcos, nem há mar, nem nada.

Onde não há vida, não há nada a suportar…, e isso que importa?

Um cais que nunca existiu, um porto que vive, mas só em sonhos vi.

Pronta para o agarrar e nele ancorar, mas nunca consegui!

Mas como eu, muitos barcos passaram e nunca aportaram…

E ambos de mãos dadas, eu e eles, procuramos ainda

Esse cais, onde ancorar.

Mas hoje já é tarde, o tempo passou.

O porto e esse cais, já não existem mais.

Hoje a espera cansou de aguardar.
O desespero e o desalento ruíram,

Afogaram-se desiludidos, perdidos pelo mar.

E eu perco-me aqui, como se este fosse o mar onde me consigo afundar.

Em vez de me perder ali ao seu lado,

Onde outros aportam seguros, num tempo parado.



Nada evoluiu e eu desisti de lutar….


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segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

O Perdão

Alberto conversara seriamente com os pais e definira com eles objectivos para a sua vida futura. Tendo em conta a situação emocional que o filho vivia e também porque nos vinhedos tudo ia muito bem, concordaram em que ele avançasse com os projectos que tinha em vista, e deixar esses vinhedos de Rioja, entregues aos cuidados dos sócios gerentes. A mãe, apesar de ir sentir a sua falta apoiou-o totalmente. Queria que Alberto encontra-se a paz que precisava para ser feliz, e isso passava por ele partir para Múrcia.

Apareceu em Múrcia parecendo um homem diferente do que costumava visitar Camila, no tempo de namoro dois anos e meio atrás. Menos altivo, de aparência mais gentil e submisso, e um pouco mais envelhecido e de semblante descontente. Tinha cortado os caracóis negros, mas os olhos mantinham o mesmo olhar penetrante, agora mais profundo e triste.
Camila com todos os acontecimentos que passara, já não lembrava muito, porque isso a atormentava e procurara esquecer para seu bem, o dia em que amarfanhara entre dedos até desfazer, a foto que encontrara naquele quarto mobilado, e aquelas roupas de mulher. Queria esquecer tudo isso, mas agora que ia novamente ser mãe, esperava ganhar um pouco de coragem para ir a Logroño falar com Alberto e com os sogros acerca da sua situação. Andara entusiasmada com a remodelação da loja, deixara o tempo passar, mas chegara a altura de resolver esse dilema, sem imaginar que essa resolução vinha a caminho.

Quando a porta bateu Camila não estava na loja, mas lá dentro, mas sentiu o seu tilintar inconfundível. Naquele momento não foi ela que veio atender, mantendo-se dentro de casa a cuidar de outros assuntos. Mais tarde, quando apareceu no bar, aquele vulto que olhava para a tela, à entrada da sua loja fê-la estremecer de alto abaixo. Conheceria aquela fisionomia à distância em qualquer local, ainda que mais magro, de cabelo mais curto, a sua presença ali na loja queria dizer-lhe muito.

E calmamente foi ter com ele. Há tanto que não se viam que por terem tanto que dizer, ficaram ambos mudos olhando-se apenas. Camila gostava tanto dele ainda, e estava tudo tão distante, que sentiu que já não estava revoltava, e quase lhe apeteceu agarrar-se ali aquele homem como se nada tivesse acontecido nunca. Mas manteve a sua compostura, afinal ela não era uma pessoa inconsequente. Alberto olhou-a muito corado, com um ar humilde, como nunca o vira ficar, muito diferente do Alberto que estava habituada, e ela que o esperava há tanto tempo, limitou-se a convidá-lo a atravessar a loja e a entrar ao fundo, em sua casa, muito civilizadamente. Nem acreditava que Alberto estava ali para conversarem. Tinham tanto para resolver e combinar.

Mas Alberto não lhe deu tempo para pensar muito mais, e antes que lhe faltasse a coragem, mal entrou dentro de casa foi directo ao assunto.

-Sei que não deves querer saber de mim para mais nada. Tratei-te mal durante todo o tempo que estivemos juntos, fui um imbecil, não soube ver a mulher que eras e o quanto me querias, nem reconhecer o quanto eu te queria também. Se me quiseres ouvir conto-te tudo.

-Mas tudo o quê? A tua história com aquela outra mulher? Podes ficar com ela. De ti já não espero mais nada. Só espero que me ajudes a criar o nosso filho.

-Não Camila, estás enganada, não há nenhuma outra mulher, não assim, como estás a imaginar. Quando casei contigo, de facto tinha perdido uma mulher, mas já não estava com ela há algum tempo, tinha morrido, estivemos noivos, vivemos, mas antes de casar (…)
E contou-lhe toda a história, que Camila foi ouvindo meio incrédula, meio descrente, como se tudo não passasse de uma invenção irreal da sua cabeça, por ser uma história tão inverosímil. Nem queria acreditar que vivera ocupando o lugar de outra mulher, e apenas isso.

Mas e os beijos, e todos os carinhos que sentia, teriam sido todos falsidade? Sentia Alberto tão sincero e tão entregue a ela quando a beijava e estavam juntos, tudo aquilo teria sido fingimento dele?
-Mas eu, amei-te assim que te vi naquele baile -dizia-lhe Camila- depois cada segundo que estava longe de ti pareciam-me anos, e mais tarde quando casámos parecia que me repudiavas, que te vingavas de algo. Amavas-me com raiva, com violência, magoavas-me, porquê, por eu não ser Letícia?
-Já te amava, mas não aceitava tê-la perdido daquela forma. E tu, ali no seu lugar, vivendo a vida, que podia ser a minha e a dela.

sábado, 22 de janeiro de 2011

COM tudo e SEM nada

Quando não se está  bem, não se está bem em nenhum lado
                 O coração aperta sem fazer ruido, e devagarinho tudo se cala.
                 Não se ouve nada,  deve ser para não incomodar o tempo
                 Assim não há barulho, e o coração bate sempre compassado
                                      
                Não se sente nada, não se tem frio, nem calor, não se respira quase.
                Já não há vento, nem sol, nem chuva, as forças da natureza já se foram.
                Mas viver assim não é existir, e o coração quase tem medo de parar.
                Ali ao lado parece que todos dormem, continuando compassadamente a respirar.

 Noutros lugares,  mais além, todos têm  muito que fazer.
 E correm, conversam, atarefados vivem a  vida  todos os dias.
 Devem rir, comer, dormir, amar , trabalhar, em suma viver.
 Conviver se for preciso, sempre com o coração a bater bem compassado.
 Mas aqui nunca se faz nada, e o mundo parece que para.

Vem  vento, chuva  e sol, venham visitar-nos todos, mas eles não chegam.
 Parece que nada bule, como no silêncio da noite, aqui nada se aquieta.
 Por vezes, muitas vezes, aqui custa a viver, e nada pára.
 Mas mesmo assim, aqui vive-se todos os dias.
 Aqui, onde o silêncio habita, vive-se com pouco, quase sem nada.


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segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Camila voa até ao Brasil

Pronta para viajar era a primeira vez que Camila parava para se questionar. Por alguns segundos pensou se não se teria precipitado. Todo aquele tempo de namoro e preparação para o casamento passara tão depressa que nem um segundo actuara com a razão, tinha sido sempre levada pela paixão que sentia por Alberto. Sentia-se possuída por um amor que lhe era prazenteiro, mas que quase não a deixava raciocinar, nem respirar, ser completamente livre, e só agora que deixava a sua casa definitivamente, dava conta que isso lhe trazia algum desconforto e insegurança.

Abandonar a casa onde sempre vivera desde menina com os pais e Gila, causava-lhe agora na hora da partida, um certo peso e mágoa. Não tivera tempo para pensar, porque talvez por medo, ou porque pensara que seria forte o suficiente, não se dera ao trabalho de o fazer. Quisera evitar fazê-lo, quem sabe inconscientemente, com receio da resposta, ou de algum pequeno vacilo, que o seu coração lhe poderia dar.

Não queria perder Alberto por nada, pois estava deveras apaixonada, e via agora que a sua precipitação naquele abandono drástico da mãe e da sua casa lhe ia ser doloroso. Estava presente em todas aquelas coisas que fizeram parte da sua vida, para poder deixá-las assim sem sentir mágoa, mas era tarde e não podia recuar. Semeara tantos sonhos e colhera, pensava ela, tudo o que desejara, sem saber ainda se a colheita seria produtiva e positiva de verdade.

Abandonava a sua cidade, os seus amigos, o trabalho, os passeios à praia, o mar de Múrcia, a praça sempre cheia de flores, os bares e todos os locais que visitara tantas vezes com os amigos, mas mais importante que tudo, abandonava a loja de antiguidades e o aconchego da casa onde nascera e fora criada com todo o amor pelos pais, onde aprendera a amar e ser amada como só eles sabiam amar. A mulher que partia ao recordar tudo isto, sentia uma amargura infinita que não conseguia explicar.

Camila tentou ocultar dentro de si este sentimento, que mesmo assim era bem visível no seu rosto, para Alberto não se aperceber.

Mas na verdade, ele não se apercebia, ou parecia não se aperceber de muitas coisas, das suas preocupações, do seu excesso de trabalho durante o casamento, de como ficaria a vida da sogra depois de eles partirem, da loja da sogra, agora que estava viúva. Alberto só desejava Camila ardentemente, e sempre que a olhava parecia alucinado, e sem se aperceber se isso era amor, paixão, ou simplesmente desejo, Camila deixava-se envolver cada vez mais por esses laços fortes que a acorrentavam e atraíam a ele de uma forma que a deixavam incapaz de ver que aquele homem não desejava dela muito mais além disso.

Na hora de partir, deixar a mãe sozinha, ainda que esta ficasse com a velha Gila, causava-lhe uma tristeza e um transtorno infinito, acrescido do facto de Pia lhe ter afirmado que sozinha, raramente a iria visitar a Rioja, por não ter gostado da família de Alberto.

Tudo isto lhe provocava uma sensação de abandono e solidão, como se ao sair dali algo dentro dela morresse um pouco para sempre. Sentia como se estivesse a ser despojada, deitada para fora de bens que lhe pertenciam e nunca mais seriam dela, ainda que neste caso fosse ela própria que se despojasse a si mesmo. Era como uma auto flagelação a que Camila se submetia naquele momento que partia, mas à qual haveria de resistir, pois esperava ser feliz com Alberto a ponto de se compensar de todas essas lacunas. Pensava falar muitas vezes com a mãe e visitá-la as vezes necessárias para matar saudades e resolver algum assunto que fosse necessário, mas ao final daquele dia ao contrário do que imaginara estava abalada e um pouco triste.

Alberto viu tristeza na atitude de Camila pela sua saída daquela casa, mas não fez perguntas, não teceu qualquer comentário a qualquer variação de estado de espírito da mulher, não referiu absolutamente nada, limitando-se a dizer-lhe que não se podiam atrasar porque tinham um voo a fazer.

Alberto parecia acomodado demais naquele afastamento, tendo em conta que uma das mulheres que se apartava naquele momento, era a mulher da sua vida. Ele despediu-se de Pia como de costume, e nem reparou, que depois do longo abraço que a mãe e filha deram, o rosto de Camila mudou, os seus olhos azuis ficaram mais escuros e caídos e os de Pia também. Durante muito tempo chorara para dentro, engolindo a mágoa de ver a filha partir tão depressa, mas depois de os ver retirar, não se conteve mais e os seus olhos choraram até as lágrimas secarem.

Pia estava uma mulher prostrada e fria desde que Geraldo morrera, e isso acentuara-se depois de saber que Camila casaria e partiria para viver com o marido. Jurou que nunca mais choraria por nada, nem por ninguém.


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segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

O regresso de Alberto

Alberto estava constantemente a surpreende-la. Antes de adormecer Camila agradeceu a Deus, e à mãe, que acreditava a estava também a proteger.
De manhã Alberto estava feliz e tinha muitas surpresas para Camila, tantas que ela nem imaginava. O céu enevoado e os dias escuros tinham passado. Ao acordar Camila parecia ainda estar a sonhar, mas não, Alberto estava ali e apressava-a para saírem pois tinham assuntos para tratarem em comum.

Vamos Camila, quero muito mostrar-te uma coisa, que sei vais gostar.

Levou-a exactamente à mesma Avenida onde anos atrás ambos se tinham amado a primeira vez, e onde ele a tinha pedido em casamento.

-Mas esta rua, este prédio, que vamos aqui fazer?

-Quero que vejas. Gostas desta Avenida não é muito longe da tua loja, que ainda não te disse mas está maravilhosa. Estou orgulhoso de ti. Podes montar mais daquelas casas, tipo bar, livraria, que penso vais ter muita clientela. As pessoas vão aderir a essa tua ideia genial.

-Obrigada, mas gosto desta Avenida sim senhor, e deste local também pois se foi aqui que eu e tu estivemos juntos a primeira vez, como posso esquecer-me disso. Ainda que me lembre a perda do meu pai.

- Não vamos lembrar-nos de coisas tristes e vamos subir, sim amor?

Subiram e quando Alberto abriu a porta Camila ficou estupefacta, atónita, boquiaberta, sem saber o que dizer. Aquela sala de entrada não tinha nada a ver com aquela outra que vira uns dois anos antes, que mesmo assim já era bastante interessante.

Tudo novo, moderno, estilo exactamente como ela gostava, e á medida que entrava, e ia abrindo a diversas divisões, uma a uma, todas a iam surpreendendo uma cada vez mais que a outra, todas elas decoradas com um gosto requintadíssimo, uma casa de sonho, como ela imaginara ter em solteira, antes de casar. Um salão de entrada amplo, mas com vários espaços muito bem definidos, com acesso à cozinha, três quartos, um deles enorme, parecendo uma suite, cada um com casa de banho, um escritório, e uma lavandaria e arrumos.
O que viu deixou-a perplexa, sem saber o que pensar, mas claro que disse a Alberto que o andar estava um luxo.

Ele, simplesmente esticou o braço, e com a chave na ponta dos dedos disse:

-Gostas, espero que sim, porque o arranjei inteirinho a pensar em ti. Toma, é teu, a minha oferta de casamento, que estava em atraso. Se preferires podemos viver aqui com os nossos filhos, caso contrário viveremos na loja, como queiras Camila.

-Meu? Mas, como meu, e viver aqui como? Disseste podemos viver aqui, mas e Logroño, e os vinhedos no norte, o teu trabalho? Não sei o que pensar se na casa se em ti a viver aqui comigo.

- Meu amor, vou passar a viver contigo como devia ter feito sempre, aqui em Múrcia. Nesta casa onde um dia te pedi em casamento, peço-te hoje que me aceites para teu companheiro para toda a vida, já que sou o pai dos teus filhos, porque te amo, porque te quero fazer feliz.

Camila, nem sabia o que dizer. Alberto estava de facto outro homem o homem que ela sonhara ter.

-Mas e o teu trabalho, os teus pais?

-Tudo está resolvido. Arranjei um emprego numa adega famosa na rota de vinhos de Múrcia, entre Jumilla e Yecla., não muito longe daqui. Irei trabalhar com uma das castas mais famosas de Múrcia, Monastrel. Os meus pais estão bem e felizes por ti, irei ou iremos, se quiseres visitá-los lá, de quando em vez e virão cá eles, enquanto puderem para ver os netos.

- E os vinhedos no norte?

- Irei lá só de vez em quando. Gustavo e Eduardo sabem muito bem o que fazer e de avião também lá chego num instante, mas não te preocupes que se for preciso arranjo mais pessoal para ajudar aqueles dois, pois não pretendo mais sair de junto de ti.


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domingo, 9 de janeiro de 2011

A Moda e a sua visão mais negra!!

Não se consegue passar imune ao que sucedeu ontem com nossos compatriotas, nos Estados Unidos.
Um jovem e um homem bastante mais idoso, mas a idade aqui não conta, encontraram, de uma forma dramática um final nas suas vidas, um para sempre, ainda sem se saber bem ao certo como disse adeus para sempre à vida, o outro porque de alguma forma se envolveu nessa terrível cena violenta da morte do seu companheiro de quarto, também tem a sua vida destroçada.

Dois amores. Amores a quê, porquê, com que sentido? A quem?
Amor em que circunstâncias?
Amor ao próximo, a uma causa, a um sonho?

Amor à moda,pela moda?
MAS SÓ ISSO É MUITO POUCO!!!!!
Amor ao prazer de um sonho,ou ao próximo?
Amor a um companheiro?
Amor em excesso, traiçoeiro, vingativo,mas que amor é este?
Amor que premeia, destroi e mata?
Mas que raio de amor é este?
A moda estava no meio. Ama-se a moda, ama-se uma pessoa, e por uma causa que se ama, tudo se faz, mas tudo o quê, e até que ponto, tudo se faz?
Mas quem ama mais, quem ama a moda pela moda, ou quem ama aqueles que fazem a moda ser moda.
Como é triste amar seja o que for, e obter como resultado sangue, solidão, abandono completo,desprezo e chegar à morte.

Para quê levar ao extremo, por um sonho que pode durar tão pouco, que é apenas isso ,um SONHO, a própria vida e a vida de outras pessoas.
Pelo meu sonho eu dava tudo, quantos não afirmam isto.
Se não conhecemos as pessoas, os ambientes, as causas por que lutam, por que razão nos havemos de envolver em situações que nos podem levar a cometer autenticas loucuras?

Somente por um sonho, que nos prometeram realizar, e a todo o custo queremos ver cumprido?

Mas SE é um sonho, e se ao acordar nos damos com a dura realidade de ontem, valerá a pena sonhar?
Abusca de sonhos foi e será sempre uma guerra desumana. Só vencem os MELHORES e mais resistentes.
Nem todos têm a mesma sorte na realização dos seus sonhos.
Tem que se ser forte, lutar e ver bem onde se colocam os pés, não ir atrás de facilitismos, pois nada vem ao mundo sem sacrifício, nem NINGUÉM dá nada sem receber algo em troca.

Não se deve prometer o que se não consegue dar.
Ninguém consegue dar o que não tem.

Lutar pelos SONHOS, sim e sempre, mas dentro do razoável, pois já o poeta dizia:

“.....QUE SEMPRE QUE O HOMEM SONHA
 O MUNDO PULA E AVANÇA
 COMO BOLA COLORIDA
 ENTRE AS MÃOS DE UMA CRIANÇA.....”

Mas assim, onde foram parar os sonhos de RENATO....... onde?

Ao CARLOS CASTRO, paz à sua alma, que sempre mostrou ser um bom homem.

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sábado, 8 de janeiro de 2011

Diego e Marta

Diego chegou a casa e a cena que viu encheu-o de ternura. Deitados sobre a cama, Marta dava de mamar ao filho, que deitado ao seu lado sorvia da mama da mãe o leite com sofreguidão. Ela passava-lhe os dedos pelo cabelo e o bebé deliciava-se com esses carinhos. Se pudesse pintava aquela cena, mas registou-a na sua memória para mais tarde a colocar na tela, e ao olhar Marta assim viu-a diferente de outrora, menos altiva, mais mulher. Se Marta lhe desse um pouco mais de atenção, tivesse tempo para ele, se o acompanhasse e partilhasse com ele a sua vida talvez ainda pudessem ser felizes. Estava bonita e atraente e vendo-a assim deitada daquele jeito com o filho, sentiu desejos de a beijar, de a possuir de lhe dizer que deviam tentar novamente.

Sentou-se junto dela, e os carinhos que ela fazia ao filho, Diego começou a fazer-lhe a ela.
-Estás bonita Marta, e o nosso filho, está lindo como tu. Tinha saudades de vos ver. Sabes que muito mais dele que é o meu preferido, mas tu estás maravilhosa.

-Diego, não exageres. Diego é muito lindo, mas é parecido contigo. A minha mãe disse-o desde que o viu e tem razão.

-Marta, sempre lhe puseste o meu nome? És um amor, e a tua mãe disse-te que ele é parecido comigo? Nem posso acreditar, tenho que ir a Madrid dar-lhe um beijo enorme.

-Mas sabes que estás bem, acho-te mesmo magnífica. Posso deitar o Diego na caminha dele. Preciso desta para nós, e sorriu imenso.

-Marta passou-lhe o menino para o colo, e ele com todo o cuidado e muito naturalmente como se já o fizesse há muito tempo, deitou-o na sua caminha ao fundo do quarto, no cantinho que Diego tinha preparado para ele no seu quarto.

Depois aproximou-se de Marta e foi franco:

-Estou carente de amor. Estás encantador, és a mãe do meu filho, porque não tentamos reaproximarmo-nos.
E abraçando-a talvez como nunca o fizera antes, beijou-a com muita ternura, imenso carinho e um desejo que desconhecia poder sentir por Marta. Já não se lembrava de estar ou beijar alguém depois daquele dia que beijara Camila. E de facto gostava do que sentia naquele momento com Marta. Nasceu-lhe a esperança de um reinício e Marta prometeu-lhe que iria fazer tudo para ser mais presente. Junto da mãe, sentiu a falta de Diego e enquanto o filho crescia e o tempo passava, confessou a Diego que desejava muito aquele momento. Iria fazer tudo para conciliar o trabalho na universidade, o crescimento do filho e o seu total apoio a ele.

Naquela tarde, ambos reafirmaram um ao outro que seria possível recomeçar, envolvendo-se como nunca, com extrema doçura, um prazer infindo, uma vontade enorme de que aqueles momentos nunca mais tivessem fim. Diego prometeu-lhe que iria esquecer “ antigos devaneios” e “paixões antigas”, queria ser-lhe fiel de corpo e alma, e naquele dia apesar de toda aquela paixão, Marta teve a certeza que não ficou grávida, mas garantiu-lhe que gostava tanto das emoções que vivia com Diego Júnior, que ainda haveriam de ter mais um filho.


Diego estava tão feliz que nem sabia que pensar.

Ele que sempre imaginara divorciar-se porque a mulher não lhe dava qualquer apoio, e depois fora
Marta a sugerir-lhe o divórcio, estava ali a amá-lo como nunca, e a dizer-lhe que lhe daria mais um filho.
 Não ele não estava a sonhar.
 Diego merecia ser feliz.


Fotos do Goggle

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Rapaz solteiro......



 Conheci "valter hugo mãe", como se assina,sempre com letra minuscula, num presente de Natal.

 O livro "contabilidade" é diferente e muito bom, de tal forma, que nem tenho palavras para o descrever ou classificar.
Eu, simplesmente gosto.

Convido a que todos o visitem.

Deste  SEU livro, deixo um poema.

                                              "rapaz solteiro procura rapariga interessada"


a norma diz que as raparigas
fazem tudo de propósito. é um
modo de dizer que o propósito das
raparigas são os rapazes, e que não
pensam em mais nada, a norma
via zangar-se quando ler este poema,
seguramente sentirá que sou
machista  e que menorizei a nossa
conversa. as raparigas,segundo o que
observei, são diferentes da minha
amiga, não afirmam muitas coisas,
esperam para ver e avançam em
desespero. as raparigas, tenho a certeza,
teriam muito que aprender com a
norma, assim se mantivessem mais
decididas e estáveis em cada momento.

eu queria encontrar uma rapariga como a
norma que, sem dúvidas, me suportasse num
casamento eterno e me fizesse pensar tudo
ao contrário do que penso agora

dE ; valter hugo mãe

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Pia morre!


Diego abraçara Camila e não mais a deixara, dizendo-lhe sempre:
-“Tem calma, não sabes o que é, acalma-te, estarei sempre contigo.”
No gabinete o médico-cirurgião explicou:

-Fizemos tudo como tinha que ser feito. Nada foi deixado ao acaso. Tudo estava a correr muito bem. Mas mesmo no final da intervenção, um problema que não estávamos a prever aconteceu e não foi possível reverter a situação por mais que tivéssemos tentado. Todos lamentamos o que aconteceu à sua mãe, mas o que é pouco provável aconteceu e Pia não resistiu a uma paragem cardíaca.

Camila parecia que estava adormecida, não queria acreditar que aquilo que aquele homem lhe dizia era verdade. Ultimamente a sua vida era um pesadelo. Tinha tido uma infância e adolescência maravilhosas, e de repente a vida mostrara-se completamente madrasta para ela. Naquele instante sentiu-se perdida no mundo, pequena, indefesa, sentiu medo, queria fugir, gritar, sair dali, queria que lhe dissessem que tudo aquilo era um sonho medonho, e começou a ver tudo a andar à roda, a girar, girar, de tal forma que quando voltou a si estava deitada numa cama e Diego fazia-lhe carinhos, afagando-lhe o rosto.

-Então é verdade a minha mãe não resistiu à operação?

E chorou, como antes jurara que nunca mais choraria por ninguém. Não tinha explicação a dor que sentia por perder a sua mãe, a mulher que lhe dera a vida. Agora que era mãe, esse sentimento tinha para ela um peso muito maior, e essa dor caiu mais fundo ainda dentro dela.

Camila nunca mais seria a mesma a partir daquele dia. Privara a sua mãe de tanta coisa, e por muito que quisesse evitar naquela hora esse pensamento, sentia-se culpada de muitas horas de sofrimento que lhe tinha causado.

Camila estava sozinha com Carlinhos e Alberto continuava a pensar a melhor forma de lhe pedir perdão, sem imaginar a tortura por que ela passava.

Perdera o pai, o seu apoio, o seu amor e carinho imensos, aquele braço forte sempre presente, que nunca lhe faltou em nenhuma circunstância, quando precisou de fazer algo que precisasse do seu aval, da sua força, do seu bem-querer. Dele só recebeu bons exemplos e uma formação modelo para transmitir aos seus filhos.

Agora perdia a mãe, e com ela desmoronava-se a família que os pais tinham construído com ela, tanto amor e carinho. Sentia saudades daquele colo, do regaço da sua mãe, dos seus afagos, dos seus aconchegos, e no seu coração crescia uma dor sem fim, uma saudade sem limites, uma mágoa infinda de todas as coisas que deixou por lhe dizer.

Restava-lhe pelo menos a certeza de não a ter magoado com as desavenças dos problemas da sua vida.

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

O quarto negro!

O que viu deixou-a deslumbrada, perplexa e confusa, mas aflita e sem palavras, porque o que via colocava em risco a sua vida no futuro. Sentia-se admirada, sem entender o porquê da proibição de entrar naquele quarto, com um sentimento que ao princípio nem sabia explicar para si própria o que queria significar, um quarto que afinal era um quarto de dormir, mais bonito que o seu foi o que sentiu, não era, nem nunca fora decerto o escritório do avô Carlos? Alberto tinha-lhe mentido, mas porquê, qual a razão?

O quarto não tinha secretária, nem escrivaninha, nem livros, nem nada que lembrasse um escritório. Mas uma cama, um roupeiro, um pequeno cadeirão, e outros móveis adequados a um quarto de dormir, tudo muito arrumado, parecendo que ainda no dia anterior lá tinha dormido gente.

Tudo bem arranjado e com muito bom gosto, desde a colcha, aos cortinados, às peças de decoração colocados em cima dos móveis, espalhados organizadamente pela divisão. Uma pequena poltrona forrada da cor dos cortinados e da colcha, nas mesinhas de cabeceira, enorme, uns candeeiros de cristal lindíssimos, no mesmo estilo do candeeiro pendente do tecto. Camila entrou obstinada e sem receio, percorrendo todo o quarto atentamente passo a passo, palmilhando lentamente com os dedos toda a mobília. Ao mesmo tempo ia pensando:

-Afinal porque não queria o Alberto que eu entre aqui, se isto é apenas um quarto por sinal muito bem cuidado, bem organizado, bem mais interessante que o meu, nem tem pó nem nada, é tudo muito estranho? Gostava muito que ele me explicasse o porquê dessa proibição, pensou meio indignada e confusa.

Quando passou pelo roupeiro arrepiou-se, pois lá dentro ao contrário do que esperava, encontrou algumas peças de roupa penduradas em cruzetas compondo o móvel no seu interior. Roupa de senhora, duas saias coloridas, uns vestidos, blusas e como aquilo a incomodou, fechou de imediato o armário, continuando a tactear.

De repente os seus dedos pararam numa moldura que estava sobre a cómoda. Nessa moldura a fotografia de um homem chamou-lhe especialmente a atenção. Ao lado dele, sentada numa poltrona do salão das refeições, uma jovem loira muito bonita sorria para ele e ele charmoso, moreno com os cabelos negros um pouco encaracolados e uns olhos negros que ela bem conhecia, sentado no braço da poltrona, olhava para ela com uma doçura infinita, parecendo-lhe aquele, exactamente o mesmo olhar que a perseguiu, naquele dia em que conheceu o Alberto no seu baile de finalistas.

Que bem que ela conhecia aquele homem, e muito melhor a doçura daquele olhar. Desmanchou a tremer aquele caixilho, como se um relâmpago a tivesse percorrido, e leu escrito na parte de trás da foto, com uma letra que reconheceu ser a do Alberto “Juntos para sempre, com amor, Alberto”. Não havia como enganar, pois a dedicatória estava assinada por ele.

Camila não queria acreditar. Alberto tinha outra mulher. Mas não entendia porque tinha aquele quarto, ali encostado ao seu, mas naquele momento nem queria saber. Estava enjoada com tudo aquilo, magoada demais com tanta mentira e falsidade. Estava confundida e tão injuriada, que nem conseguia pensar correctamente.

Naquela casa todos lhe tinham mentido. Tudo tinha sido uma farsa, mas ela nem entendia o porquê de tudo aquilo. Todos deviam saber que aquele quarto existia daquela forma, e o que ele significava, todos menos ela. Alberto era tudo menos o marido sinceramente apaixonado que ela sonhara ter, e aquela foto dizia-lhe isso, mas não entendia mais nada. Alberto tinha duas mulheres e isso era horrível.

Ele era traidor, falso, nunca a terá amado e era mentiroso. Sem dar conta amarfanhara entre os seus dedos aquela foto, enquanto teve força e ela existiu como papel. Não se lembra quanto tempo passou a chorar encostada à parede daquele quarto, sem saber o que pensar de tudo o que tinha encontrado ali dentro, do que Alberto fizera da sua vida, até que de repente ouviu o choro de Carlinhos que a trouxe à realidade, e ao ouvir o choro do seu filho, resolveu que queria sair daquela casa para fora o mais depressa possível.

Todos a tinham enganado, fosse o que fosse que aquilo representasse, aquele quarto era um lugar onde Alberto dormiu e viveu com outra mulher, isso, ela tinha a certeza, e esse tempo e espaço representaram tanto na sua vida que ele os preservou, e isso magoou-a tanto que não era capaz de se imaginar a olhar o homem a quem entregou a sua vida, em quem confiou totalmente, a quem tudo perdoou por tanto amar, e que a traiu, e traía ainda, com certeza, que lhe mentiu, e provavelmente nunca a amou ou se quer a desejou e simplesmente a usou. Alberto era um traidor e fingido, só não conseguia entender porque casara com ela, se tivera e quem sabe tinha ainda, aquela ali ao lado.

Naquele momento isso explicava muita coisa, e os seus olhos choravam sem parar, a sua alma sofria tanto que ela não conseguia ver nada mais, que dor e sofrimento à sua volta. Queria sair dali depressa para algures onde ninguém pudesse encontrá-la. Precisava estar só com o filho e pensar em tudo aquilo que tinha vivenciado.
No seu quarto, conforme conseguiu, juntou imensas roupas do filho, e dela apenas o suficiente para algumas mudas, pois não queria levar dali nada que lhe recordasse o tempo que viveu com aquele homem.

Não parava de chorar. Fez uma chamada a Diego que ficou preocupado com a sua voz e se prontificou a ajuda-la sem fazer perguntas, pois foi o que Camila lhe pediu, apenas abrigo temporário. Enquanto preparava as suas malas e amarfanhava furiosamente para dentro delas o que precisava com alguma violência, passavam-lhe na cabeça várias cenas da sua vida com Alberto.

Do dia do casamento recordou com ternura o ritual da mantilha, e a promessa que ele lhe tinha feito, quando lhe descobriu o rosto e a beijou.
Queria destruir aquela mantilha.......