terça-feira, 4 de janeiro de 2011

O quarto negro!

O que viu deixou-a deslumbrada, perplexa e confusa, mas aflita e sem palavras, porque o que via colocava em risco a sua vida no futuro. Sentia-se admirada, sem entender o porquê da proibição de entrar naquele quarto, com um sentimento que ao princípio nem sabia explicar para si própria o que queria significar, um quarto que afinal era um quarto de dormir, mais bonito que o seu foi o que sentiu, não era, nem nunca fora decerto o escritório do avô Carlos? Alberto tinha-lhe mentido, mas porquê, qual a razão?

O quarto não tinha secretária, nem escrivaninha, nem livros, nem nada que lembrasse um escritório. Mas uma cama, um roupeiro, um pequeno cadeirão, e outros móveis adequados a um quarto de dormir, tudo muito arrumado, parecendo que ainda no dia anterior lá tinha dormido gente.

Tudo bem arranjado e com muito bom gosto, desde a colcha, aos cortinados, às peças de decoração colocados em cima dos móveis, espalhados organizadamente pela divisão. Uma pequena poltrona forrada da cor dos cortinados e da colcha, nas mesinhas de cabeceira, enorme, uns candeeiros de cristal lindíssimos, no mesmo estilo do candeeiro pendente do tecto. Camila entrou obstinada e sem receio, percorrendo todo o quarto atentamente passo a passo, palmilhando lentamente com os dedos toda a mobília. Ao mesmo tempo ia pensando:

-Afinal porque não queria o Alberto que eu entre aqui, se isto é apenas um quarto por sinal muito bem cuidado, bem organizado, bem mais interessante que o meu, nem tem pó nem nada, é tudo muito estranho? Gostava muito que ele me explicasse o porquê dessa proibição, pensou meio indignada e confusa.

Quando passou pelo roupeiro arrepiou-se, pois lá dentro ao contrário do que esperava, encontrou algumas peças de roupa penduradas em cruzetas compondo o móvel no seu interior. Roupa de senhora, duas saias coloridas, uns vestidos, blusas e como aquilo a incomodou, fechou de imediato o armário, continuando a tactear.

De repente os seus dedos pararam numa moldura que estava sobre a cómoda. Nessa moldura a fotografia de um homem chamou-lhe especialmente a atenção. Ao lado dele, sentada numa poltrona do salão das refeições, uma jovem loira muito bonita sorria para ele e ele charmoso, moreno com os cabelos negros um pouco encaracolados e uns olhos negros que ela bem conhecia, sentado no braço da poltrona, olhava para ela com uma doçura infinita, parecendo-lhe aquele, exactamente o mesmo olhar que a perseguiu, naquele dia em que conheceu o Alberto no seu baile de finalistas.

Que bem que ela conhecia aquele homem, e muito melhor a doçura daquele olhar. Desmanchou a tremer aquele caixilho, como se um relâmpago a tivesse percorrido, e leu escrito na parte de trás da foto, com uma letra que reconheceu ser a do Alberto “Juntos para sempre, com amor, Alberto”. Não havia como enganar, pois a dedicatória estava assinada por ele.

Camila não queria acreditar. Alberto tinha outra mulher. Mas não entendia porque tinha aquele quarto, ali encostado ao seu, mas naquele momento nem queria saber. Estava enjoada com tudo aquilo, magoada demais com tanta mentira e falsidade. Estava confundida e tão injuriada, que nem conseguia pensar correctamente.

Naquela casa todos lhe tinham mentido. Tudo tinha sido uma farsa, mas ela nem entendia o porquê de tudo aquilo. Todos deviam saber que aquele quarto existia daquela forma, e o que ele significava, todos menos ela. Alberto era tudo menos o marido sinceramente apaixonado que ela sonhara ter, e aquela foto dizia-lhe isso, mas não entendia mais nada. Alberto tinha duas mulheres e isso era horrível.

Ele era traidor, falso, nunca a terá amado e era mentiroso. Sem dar conta amarfanhara entre os seus dedos aquela foto, enquanto teve força e ela existiu como papel. Não se lembra quanto tempo passou a chorar encostada à parede daquele quarto, sem saber o que pensar de tudo o que tinha encontrado ali dentro, do que Alberto fizera da sua vida, até que de repente ouviu o choro de Carlinhos que a trouxe à realidade, e ao ouvir o choro do seu filho, resolveu que queria sair daquela casa para fora o mais depressa possível.

Todos a tinham enganado, fosse o que fosse que aquilo representasse, aquele quarto era um lugar onde Alberto dormiu e viveu com outra mulher, isso, ela tinha a certeza, e esse tempo e espaço representaram tanto na sua vida que ele os preservou, e isso magoou-a tanto que não era capaz de se imaginar a olhar o homem a quem entregou a sua vida, em quem confiou totalmente, a quem tudo perdoou por tanto amar, e que a traiu, e traía ainda, com certeza, que lhe mentiu, e provavelmente nunca a amou ou se quer a desejou e simplesmente a usou. Alberto era um traidor e fingido, só não conseguia entender porque casara com ela, se tivera e quem sabe tinha ainda, aquela ali ao lado.

Naquele momento isso explicava muita coisa, e os seus olhos choravam sem parar, a sua alma sofria tanto que ela não conseguia ver nada mais, que dor e sofrimento à sua volta. Queria sair dali depressa para algures onde ninguém pudesse encontrá-la. Precisava estar só com o filho e pensar em tudo aquilo que tinha vivenciado.
No seu quarto, conforme conseguiu, juntou imensas roupas do filho, e dela apenas o suficiente para algumas mudas, pois não queria levar dali nada que lhe recordasse o tempo que viveu com aquele homem.

Não parava de chorar. Fez uma chamada a Diego que ficou preocupado com a sua voz e se prontificou a ajuda-la sem fazer perguntas, pois foi o que Camila lhe pediu, apenas abrigo temporário. Enquanto preparava as suas malas e amarfanhava furiosamente para dentro delas o que precisava com alguma violência, passavam-lhe na cabeça várias cenas da sua vida com Alberto.

Do dia do casamento recordou com ternura o ritual da mantilha, e a promessa que ele lhe tinha feito, quando lhe descobriu o rosto e a beijou.
Queria destruir aquela mantilha.......

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