OS MEUS LIVROS,
NELES ESCRITAS AS PALAVRAS QUE A ALMA ME DITA,
CONTANDO HISTÓRIAS DE VIDA,
ONDE ME ENCONTRO ME SINTO E VIVO.
ESTE LIVRO, um romance com 400 páginas custa 14 euros, com os portes de CTT incluídos.
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E ASSIM AQUI DEIXO O PREFÁCIO DE "AQUI VAI O LENÇO", SÓ PARA ABRIR O APETITE AO LEITOR
E ASSIM AQUI DEIXO O PREFÁCIO DE "AQUI VAI O LENÇO", SÓ PARA ABRIR O APETITE AO LEITOR
PREFÁCIO
Nenhuma escrita conhece fronteiras temáticas
ou estruturais, por isso constituirá sempre um exercício de liberdade, de
interpretação e criação. Sabemos hoje que, do ponto de vista teórico, o acto de
escrever inclui sempre uma componente de acção
sobre o próprio processo em si mas, também, sobre o contexto em que alguém escreve.
"Aqui vai o lenço" é um texto que
nos chama, em privado, segredando-nos mais sobre o contexto do que sobre o
processo. E a razão é tão simples, quanto óbvia. A linguagem faculta-nos modos
distintos de representação do mundo e do conhecimento que temos dele, e toda a
vez que escrevemos, cumprimos uma plêiade de funções distintas mas sempre coordenadas.
Assim, todo o processo de escrita origina um produto mais ou menos autónomo,
distante ou próximo de quem o escreveu e nele permanece o que foi escrito ou o que
foi vivido. Ou ambas as coisas.
Ora, quando escrevemos, estamos sempre a
conquistar um poder específico que é o da representação, das funções de registo
de vivências ou de fantasias, de expressão e ou de organização de factos, de
realidades ou de sonhos e, sempre que escrevemos, estão envolvidos inúmeros
factores sociais, emotivos, cognitivos ou pessoais. Deste modo, a escrita é
sempre um convite a outras escritas.
E, claro, a outras leituras.
Estas breves e despretensiosas
considerações, de superficial afloramento teórico vêm a propósito do texto que aqui
se prefacia. Na verdade, o livro que o leitor tem na sua frente não é uma história. É um conjunto de relatos,
cronologicamente urdidos por um fio peculiar de vivências. Esta característica
confere, pois, ao enunciado um estatuto de representação de uma vida, embora ela possa não ser
linearmente biográfica. Esta pretensa linha narrativa de factos parece
ensinar-nos a ler com maior precisão a especificidade tipológica deste texto, a
sua estrutura, e o seu conteúdo. E, claro, formata os modos como lemos estes trechos,
sujeitos que estão a regras próprias.
Assim, estas narrativas singela e
despretensiosamente redigidas, fazendo uso de uma linguagem simples e
desprovida de artifícios estilísticos, despidas de ornamentos retóricos,
imagens originais e rebuscadas, constituem um retrato linguístico de fragmentos
existenciais. A riqueza do enunciado também não se deve procurar na profusão
estrutural ou técnica do texto, pois em nenhum momento há eco de manifestações
que acusem um domínio técnico-narrativo singular. Mais uma vez, a simplicidade
arquitectónica do enunciado espelha a sua transparência e linearidade
discursiva.
Todo o livro é um signo, exactamente por aquilo que mostra.
E o que nos revela é, sobretudo,
autenticidade, clareza e uma paleta emocional diversificada que vai da lágrima
ao riso, da tristeza à euforia, da desilusão à esperança. Trata-se, afinal, dos
ingredientes que compõem os dias da protagonista. E este é, indubitavelmente,
um texto com protagonismo.
Isabel é essa mulher, nascida de uma família
humilde, no início dos anos cinquenta, filha segunda de um casal socialmente
modesto e profundamente arreigado aos valores culturais de uma sociedade tradicionalista
e conservadora.
Assim, as partes que constituem este livro,
são pedaços da vida de Isabel, evocados às memórias de um passado onde a
felicidade se cruzou, não raras vezes, com a solidão e a tristeza.
Curiosamente, ao longo de todas as
histórias, a narradora tenta distanciar-se delas pelo uso gramatical de uma
terceira pessoa do singular, criando um claro efeito de afastamento narrativo.
Este dispositivo, de propósitos emocionais, deixa ao leitor mais atento, a
sensação imediata que, oculta na sombra da protagonista Isabel, há uma possível
narrativa de primeira pessoa. Essas dúvidas passam para o leitor não apenas através
do entretecer das histórias, da presença constante das memórias mas, sobretudo,
pelo tom omnisciente, comovido e emocional que Isabel deixa transparecer nas
páginas de alguns dos episódios que relata.
É o que acontece, por exemplo, no reconto
dorido da "Boneca de Trapos", ou em "As Primas", "A
Avó Teresa" ou mesmo em "O saco de Nozes", apenas para enumerar
alguns dos primeiros exemplos.
Este jogo de ocultação de identidade deixa-nos
entrever, claramente, a narradora como um possível objecto da ficção, e este
procedimento está presente ao longo de todo o texto, não apenas na fase da
infância de Isabel que, enquanto menina experiencia vivências como a ida à
escola, a comunhão, as doenças de infância, mas também a acompanha enquanto
adolescente, no comboio, na primeira ida a uma discoteca, à entrada para o
liceu ou, mais tarde, para a Universidade. Este véu de encobrimento está ainda
patente, de modo contínuo, nos momentos que inauguram o primeiro beijo, ou na
descoberta da sua sexualidade, concretizada sob a almofada protectora de uma
conjugalidade que a retira, finalmente, de casa dos seus pais.
Esta Isabel, já menos menina e mais moça, é aquela que, pelo seu olhar, nos
traz também alguns episódios histórico-sociais, como a revolução dos cravos ou
a convulsão estudantil que inflama a universidade mas pela qual passa, incólume
e quase estranha. Nesta precisão de algumas vivências históricas estão, pois,
inscritos, muitos dos momentos pessoais e familiares que constituem o motivo de
todos os episódios que este livro congrega.
É por essa razão que, ao longo de toda a
narrativa, são mapeadas algumas figuras tutelares, com distinto peso e estatuto
nas emoções e na vida de Isabel. São, sobretudo, o pai, a mãe, o irmão, a avó
e, mais tarde, Pedro, o marido.
Cada uma delas, de diferente modo, cataliza
emocionalmente a protagonista e com ela interagem num complexo xadrez sentimental
que a podem fazer oscilar entre a raiva, o amor, a compaixão, a admiração ou a
pena.
A figura paterna, por exemplo, emerge como
uma personagem prototípica que sintetiza e integra o lado protector mas,
também, o rasgo de crueldade castradora própria do chefe-de-família, prepotente
e déspota, capaz de um gesto grandioso de ternura mas igualmente da atitude
mais primária e violenta. Este é, aliás, um dos aspectos que se destaca nestas
narrativas: a existência síncrona de episódios de relevo emocional distinto.
Todos eles espelham a vida de Isabel, ansiosa por se libertar do jugo paterno
e, à semelhança de muitas raparigas desse mesmo tempo e círculo social, ávida
de entregar ao marido a sua vida, destino e coração.
De modo consequente, ou não, há várias
reminiscências (por vezes explícitas) a Corin
Tellado, musa inspiradora de uma
época e de um estilo literário que marcaram várias gerações de mulheres e que,
certamente, a par das radionovelas tão populares nessa época, terão manipulado os
modos de assunção do amor e do erotismo, o conhecimento do mundo e sobretudo da
paixão. Este manto de influências não se estendeu apenas a Isabel mas a todas
as raparigas que se reviam e se inspiravam, sonhadoras, nas histórias de Tellado, narrativas onde o triunfo do amor
constituía a garantia de felicidades e de paixões perenes.
Do ponto de vista semântico é possível identificar
nestas histórias uma determinada dinâmica circular que advém deste facto: A
personagem Isabel passa toda a sua vida a escutar
os afectos e a perscrutar, atenta, os modos como era amada. Na realidade, a
segunda narrativa que abre este livro de histórias, "O casamento"
estabelece uma ponte dialogal com "O dia do casamento", quase a
encerrar o volume.
Assim, o leitor deve procurar a chave
interpretativa destes episódios neste arco temporal de duas décadas. É
precisamente aí que reside a essência de Isabel, os desafios, desilusões, a
constante sensação de rejeição, perda ou desamor que a deixam incapaz de se
situar no mapa dos afectos familiares.
Acreditamos, todavia, que a personagem
Isabel não completa todo o seu percurso de vivências e deixa entreaberta, de
modo muito claro, uma porta narrativa na parte final do texto.
De facto, se lermos atentamente "A lua
de mel", no momento em que, de mãos dadas com Pedro, "desistiu de
olhar para trás" (p.276). Já não via o pai e a mãe não tinha aparecido,
Isabel fecha um ciclo vivencial que, desde muito nova ansiava por ultrapassar.
Todavia, esta nova etapa é atravessada, em
simultâneo, pela esperança mas também pelas incertezas, e como refere: "A
Verdade é que ambos estavam ali, sem saber muito bem o que fazer". A
iniciação amorosa da protagonista não é auspiciosa e deixa-a oscilante entre a
esperança e a frustração. Por esse motivo, confessa-se "desiludida e
confusa" (p.279), e a nova fase de vida que inicia, simbolicamente, na
Falésia - lugar feliz de um imaginário passado - é, também, uma promessa de um
futuro condescendente para com as tristezas e capaz de a conduzir à felicidade.
Por isso Isabel refere, quase a fechar estes relatos, que espera
"conseguir superar todas as dificuldades" (p.281) e sentir-se gente e ser feliz.
Terá esta felicidade sido construída com a
maresia das lágrimas, com a timidez dos sorrisos ou com a subtileza das cumplicidades?
Ora, estas questões presentes nas últimas
páginas conseguem projectar uma narrativa aberta. Essa (necessária)
continuidade possibilitará ao leitor perceber de que modo Isabel cresceu e como
superou a aparente solidão a que esteve votada, e de que forma lidou com a
incómoda sensação de que era liminarmente excluída das rodas de jogo, das
amizades, e do lenço que nunca lhe caía aos pés...
Este princípio de circularidade narrativa,
de renovação e de reabertura de novos ciclos de vida é, estamos em crer, uma
promessa oculta de novas estórias.
"Aqui fica o lenço" é, por isso,
um texto sobre o triunfo de vida
pessoal que Isabel oferece ao leitor e, apesar de confessar que o lenço lhe
caiu aos pés, ele voará "ainda não sabe para onde". Desta incerteza
de que são feitas as histórias, são igualmente fabricados os sonhos de uma
vida, os momentos onde se inscrevem as memórias e os factos que os enformam.
É esta substância narrativa, genuinamente
telúrica e simples, destes sentimentos ora adultos, ora pueris, ora oníricos,
ora reais, que os olhos do leitor, apreendem. São estes episódios que nos
deixam observar uma constelação íntima de sentimentos distintos e uma
turbulência emocional cujo epicentro são as realidades vividas por Isabel.
Isento de artifícios técnico-literários e
impossível de o inscrevermos numa cartografia narrativa e canónica, este
conjunto de relatos oferece-nos, com assinalável transparência ex corde, a autenticidade humana de uma
vida, as inseguranças juvenis de uma mulher sonhadora mas ambiciosa, a indízivel
esperança que deposita na redenção do Amor e na conjugalidade cúmplice.
São, pois, estes os tons de luz e de sombra
que iluminam as estórias de um lenço que ia e vinha e tardava em ficar junto a
si mas que, um dia, finalmente lhe calhou. Onde este romance de uma vida termina, começam agora as perguntas do atento
leitor: Ao longo dos jogos da vida de
Isabel, terá raramente ficado esse lenço a seus pés…?
Pedro Balaus
Custódio
Fevereiro 2011
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