segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

O tamanho da felicidade




Foi já há alguns anos atrás.
Vi-a de manhã cedo, muito bem arranjada e penteada.
Bateu à porta de cozinha, da minha vizinha, que era sua cunhada e ouvi que lhe perguntou:
- Estou bonita, gostas?
- Está lindíssima. Agora vai para casa. Já é tarde. O arranjo que falta na sala, levo-o quando for e depois dou-te uma ajuda no vestido, não demoro. Vou só acabar de vestir a menina.

Era tão jovem, e estava mesmo linda, bem penteada e maquilhada, uma perfeição. Pronta para ser a noiva mais bonita das redondezas.
Ia casar e no seu coração construíra mil castelos de sonhos, para viver feliz, até ao fim da vida.

Esqueceu-se que a vida não é sempre linda e risonha. Que tem dores, sofrimento, tormentos e muitas lágrimas. Mas isso que lhe importava ali, naquele dia, naquele instante?

Casou, foi mãe, mulher, amante e esposa devotada. 
Trabalhou aqui ali, além, mas esforçou-se por ter e dar uma casa digna aos filhos, ao marido que eram os seus amores e de mais ninguém.



Pendurado nalgum armário bem guardado, deve permanecer o vestido que envergou naquele dia. O penteado, há muito que se desfez, como alguns dos sonhos que muito desejava e nunca concretizou. 
Mas o amor pela vida, parecia existir entre todos, era o que parecia.

Quem diz que ter dinheiro, uma casa nova bonita de tudo recheada, ter filhos belos e inteligentes, um trabalho dos melhores e bem remunerado, quem pensa que ter carro, viajar, enfim, quem avalia os outros só pelo que vê por fora nos seus rostos, nas palavras que dizem, e por isso julga e mede a felicidade que vivem e sentem, está errado, está muito enganado.



Ela parecia ter tudo para ser feliz, viver tranquila e desafogada, mas o marido e amante, o homem a quem ela queria bem, que lhe queria igualmente, que era o pai dos filhos que ambos queriam com o mesmo querer, não estava bem, não era feliz, e com a infelicidade dele, ela era infeliz também.  

Hoje foi a filha que deu com ele, inerte, ainda quente, mas sem sentidos, pendurado numa corda numa trave da dispensa.

Já ninguém chegou a tempo. 


O seu corpo quente arrefecia, a cada instante.
A filha chorava arrepiada, e o trauma de ver assim o pai, o homem que ela amava, ficará para sempre na sua jovem memória, ferida e magoada.
O filho distante no trabalho, na viagem que fará para se despedir do pai, virá decerto angustiado, uma viagem interminável como nunca mais fará nenhuma.



Mas a noiva que foi antes, a mulher que até hoje trabalhou, lutou por uma vida digna, gerou e deu à luz os filhos feitos por ambos com amor, está de luto na alma, nas vestes, e no pensamento. 

Vai continuar a lutar na vida , 
mas tudo será diferente para sempre. 

Na sua casa, a casa dela que era também dele, 
ficará para sempre a imagem daquele corpo inerte pendurado, 
a perder cor, a arrefecer, 
com o coração a ficar sereno para sempre.

Decerto nunca mais recordará o penteado lindo que lhe vi naquele dia, 
o sorriso puro e aberto daquele dia murchará para sempre, 
o vestido branco que usou no dia do casamento, 
que a fez sorrir e chorar de emoção e sentir mais alegria que nunca, 
ficará para sempre esquecido algures, 
num canto qualquer...mas isso que importa agora, se isso é passado, e este ele destruiu-o, manchando-o da pior forma 
quem sabe  definitivamente esquecido no armário das tristes recordações, quem sabe com traça, quem sabe como... 




Hoje só grita em lamentos, que penetram os poros de toda a gente a sua tristeza imensa.

- Porque fizeste isto? 
  Porque não me disseste o que tinhas? 
  Porque me deixaste assim e a eles, que sei tanto amavas e te queriam tanto bem. 
  Porquê, porque não me contaste o que se passava contigo? 
  Eu desconfiava, mas não sabia mais nada…..
  Que será de mim agora. Sem ti não serei ninguém...
  Ouve...ouve, volta para mim..., que sem ti amor como hei-de viver?

Repete, e repetirá enquanto se lembrar estas  lamurias, e outras tantas, que não o trarão de volta, mas que ela tem que gritar senão rebenta…

Vai em PAZ, DESCANSA AGORA E PARA SEMPRE!

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