domingo, 30 de setembro de 2012

UM sonho diferente..PAI!



Partiste levando contigo tudo o que considerastes teu
e eu que estava ausente, 
quando cheguei  e vi tudo mais nu e vazio
soube que foi por minha causa que o fizeste
e por isso fiquei triste e chorei,
chorei muito,
 pois sei que já não me querias, 
como sempre imaginei que nunca me quiseste.

As prateleiras antes repletas não me lembro bem do quê,
estavam  vazias, 
desertas das lembranças de família.
As paredes sem quadros,
das fotos do passado que arrancaste dali
e levaste não sei para quê, 
quem sabe para limpar mais depressa as memórias do passado.
Não havia livros, 
só alguma loiça e umas quantas peças 
indefinidas sem interesse. 

Sonho estranho,
 pois do resto  nada mais ficou, 
a não ser alguém que na sala,
atenta e calma para acalentar a minha dor 
e pacientemente escutar os meus lamentos,
ficou atenta,  
triste e chorosa, mas ali permaneceu 
sentada à minha espera.


Não, 
sei bem que não foi  ela a culpada da tua partida brusca,
uma mãe mesmo que ausente, 
mesmo que peque e não faça, ou faça só o que lhe vai na mente, 
chora pelos filhos, roga por eles
e é sempre por eles perdoada.

Apareceste mais tarde, 
bem arranjado, 
composto, com ar fresco e alinhado
de camisa verde axadrezada, 
veste para ti desusada, coisa rara, 
mas que na altura te caía bem.
Numa das mãos um ramo de rosas desabrochadas,
vermelhas de veludo, muito abertas,
nem bonitas, nem feias, 
mas que tempos antes decerto 
deviam ter sido muito mais belas e encantadas
como tu devias ter sido comigo e eu contigo outrora. 


Quando as olhei senti-as belas, 
por serem as primeiras que me davas
e por serem únicas 
e me parecerem sinceras,
senti-as as mais formosas de todas 
e mais que tudo, 
verdadeiras.

Estendeste-me a mão com elas e nesse gesto 
procurei também aquele abraço, 
aquele abraço paterno 
que me negaste a vida inteira. 

E eu faminta por nunca mo teres dado, 
aceitei de bom grado 
as flores que me estendeste, 
desabrochadas como eu 
que acolhi ali com um sorriso aberto.
E com carinho mal lhes peguei
depressa me agarrei ao teu corpo
colando-me a ele de repente
como se essa fosse o última oportunidade de o fazer. 
E por momentos sinto o amor que nos temos e nos foge,
que me negas todos os dias constantemente
repudiando-me sempre, 
como se eu fosse algo mau que te destrói 
deixando para o lado, 
morrendo lentamente 
o amor que nos temos, que nos foge, 
mas eu sei e acredito 
que ainda existe vivo entre nós,
desde que nasci há muito tempo, 
até hoje, 
que como tu, já não sou jovem e podia até já ser avó.


A terra há-de devorar um dia os nossos corpos
que igualmente se transformarão em nada e pó, 
mas para a eternidade terás sido tu sempre o meu pai
e eu a filha que um dia fizeste e depois negaste
eu creio e acredito, 
por teimosia e só de voz. 

Afinal foste tu que mudaste e não eu, 
é o que penso,
nas minhas veias é também teu o sangue que as percorre.

Vem ter comigo, abre-me os teus braços, 
despe-te dessa frieza e crueldade que te mata
e a mim me destrói cada dia mais um pouco 
e nem que seja só uma vez, 
uma vez apenas,
por essa vez que seja, dá-me um abraço
quente e amigo, mas mais que tudo paternal, 
que eu quero sentir que não te vais e nem eu parto
sem saber o que é ter o amor do nosso pai vivo em nós, 
em mim aceso,
 sentir o aconchego terno do teu apoio e do teu regaço amigo 
e eu sei, tenho a certeza, 
sempre presente.




Sonho maldito aquele que vivi, 
e não entendo
em que te vi partir 
e contudo 
regressar diferente, 
com rosas vermelhas nas mãos,
não murchas, 
mas desabrochadas e cadentes.


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