Não importava se Isabel estava muito ou pouco feliz, pois ninguém é feliz o tempo todo, mas singrara, e naquele momento na sua casa reunia um conjunto de pessoas como nunca vira fazer os seus pais na sua casa em solteira, e isso para ela queria dizer qualquer coisa, e ela sabia que a avó Teresa estava muito contente.
Nesse dia a avó Teresa ia ajudá-la a fazer o arroz pardo com o frango assado no forno. A mãe do Pedro traria de sua casa, carne de cabra (chanfana), assada no seu forno de lenha, que seria acompanhada com batata cozida, e ambos os pratos seriam acompanhados com legumes cozidos ou crus, conforme o gosto. Antes seria servida uma canja de galinha, e para o final como sobremesa avó Teresa preparou uma quantidade grande do saboroso arroz doce, que ela fazia como ninguém. Não faltaram também o leite de creme e a gelatina que o Manuel e a Maria tanto gostavam, e bolos diversos, o bolo inglês e o de mármore que Isabel tão bem fazia, uma salada de fruta e naturalmente o bolo de aniversário.
Para receber os convidados, e porque o aniversário do Pedro se festeja no verão, arranjou-se forma de todas as pessoas almoçarem no terraço das traseiras da casa. Pedro cobriu-o com ramos de eucalipto e outras árvores do monte, emprestando ao ambiente um ar fabuloso em aroma e frescura. Foram arranjadas mesas e cadeiras, para todas as pessoas, mais de trinta, e instalada uma aparelhagem para que no final da refeição todos pudessem dançar, se fosse essa a sua vontade, o que veio a acontecer.
Isabel não parou em toda a tarde, e para as mesas serviu comida, bebidas diversas, doces, tudo o que lhe iam pedido e que havia na cozinha. A festa durou até às tantas, que depois do almoço e da mesa arrumada, conversou-se, dançou-se, e preparou-se a mesa para jantar os restos que ainda eram muitos e continuar o convívio até que as pessoas cansadas se quisessem retirar, que nem Isabel nem Pedro dariam nunca a festa por terminada.
Não fora a Maria ter escorregado e ter feito um golpe no queixo, com necessidade de intervenção imediata no Centro de Saúde mais próximo, tudo tido corrido de uma forma excelente. Na verdade Maria dava todos os passos que Isabel dava. A certa altura os seus pezinhos pequenos, calçados nuns sapatinhos de sola novos, escorregaram no terraço num pouco de água que estava no chão e Maria bate com o queixo na quina de um vaso de flores, fazendo de imediato um golpe que o irmão de Isabel, médico, vê de imediato, que precisava ser suturado. Isabel fica aflita, sem saber o que fazer, nem para que lado se virar, pois a sua menina chora aflita e antes já o próprio irmão, a tentar abrir um garrafão, fizera um brutal golpe num dedo. Mas ele diz-lhe para descontrair o ambiente:
-Deixa lá, eu já devia ir ao hospital para cozer este meu dedo, assim vou mesmo, levo a menina, vejo o que lhe fazem e vêm-me isto também a mim.
-Santo Deus, tanta atribulação, e eu com tanto que fazer na cozinha, e sem coragem nenhuma para atender a minha menina.
E António, o avô, comentava:
-Mas para que é tanta coisa, tanta festa, Pedro não fazia muito bem anos sem isto tudo?
Claro que de António, todas as opiniões eram de esperar, ele era contra gasto de dinheiro desnecessário, e em reuniões desse género por maioria de razão.
Só anos mais tarde, quando os aniversários de Pedro e até os de Manuel e Maria, passaram a ser festejados com um almoço em casa de Isabel, mais intimamente, ou mesmo num restaurante, unicamente com os pais de ambos e com os netos, António deixa de refilar em relação aos gastos, mas aí, monopoliza a conversa totalmente e Isabel sente um desconforto e uma ansiedade total, sentido sempre um desejo enorme que esses momentos cheguem depressa ao fim. Será que Isabel e o pai não se entendem porque existe entre eles algo de muito semelhante ou antes pelo contrário, Isabel ainda vive presa no passado?
Mas de facto no dia da festa de aniversário dos trinta e três anos de Pedro, parece que ninguém arredava pé de casa de Isabel. O ambiente apesar dos sobressaltos, esteve óptimo, a comida melhor ainda, a avó Teresa ainda que mais velha que nos outros tempos, parecia aos olhos de Isabel, muito mais feliz que nos dias das festas na casa do tio quando todos iam para o arraial no final da procissão, porque a sentia muito feliz com aquela gente toda e aquele movimento.
Isabel recebeu os parabéns de todos pelo acolhimento e pela organização da festa, e Pedro também.
Isabel queria muito que Pedro reparasse que ela era uma mulher capaz de fazer coisas relevantes, marcantes, e bem-feitas como as outras mulheres, as esposas dos seus amigos faziam, mas Pedro chegava sempre muito cansado à noite e não tinha muito tempo para dar atenção a Isabel, não naquele tempo e naquela idade, e Isabel começou gradualmente a adaptar-se a conviver com esse silêncio, a viver com os olhos caídos sem pedir mais do que aquilo que recebia. Porém de vez em quando descaia-se, porque o seu coração emotivo disparava e perante os amigos dizia coisas que não devia.
Era o seu coração a falar mais alto!
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