Gianni lá foi aos saltos estrada fora, com a cabeça cheia de questões para colocar ao governador.
Ia entusiasmado, mas ouvira muito bem o que o pai lhe dissera, e no regresso contava trazer-lhe noticias bem agradáveis.
Chegado à casa grande bateu ao portão. Não tinha muito que enganar, toda a gente da vila sabia que era ali que vivia quem manda lá na terra. Veio logo alguém que muito agradado pela sua presença e mais ainda depois de o ver tão colorido, o mandou entrar entre gargalhadas.
Estava combinado entre os guardas deixar entrar o miudo, pois pensaram entre eles que ainda se haviam de divirtir à sua custa, e o melhor ainda, meter-lhe um cagaço, que nunca mais se havia de querer meter com eles, e ainda havia de levar o recado para os outros da sua idade e não só...,diacho de miudo atrevido.
Colocaram-no no cimo de um banco bem alto, e mandaram-no falar.
" :- Vá lá miudo, diz então que te tráz aqui, que queres saber,que aqui o representante do senhor governador está á tua disposição e nós também, pois não queremos que vás daqui com duvidas, entendido "
Em cima daquele banco, vestido daquela forma, Gianni parecia estar num palco, fazia gestos, expunha as suas duvidas com tanta elequência, que mais parecia estar a fazer um discurso reinvindicativo, e não um conjunto de perguntas. Sabia mais daquilo que dizia, que alguns guardas que o escutavam.
Era um miudo esperto e estava inteirado de coisas que nem devia, sabia demais para a idade, mas não deixava de ter graça ouvi-lo falar assim vestido daquele jeito. Sentaram-no então numa cadeira enorme que parecia um rei e começaram a rodopiar à sua volta, para se divertirem.
Naquele dia o guarda chefe estava bem disposto, e a vida ia tão mal, que para aliviar a tensão resolveu gracejar com o garoto até se fartar.
":- Ora deixa cá ver, a tua mãe não tem ordenado, a minha também não, e nenhuma tem, é proibido, não sabias ?", e riam-se todos.
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":-As familias partem da vila, ora pois, porque há-de ser, porque vão visitar as suas familias e por lá ficam porque é o que desejam, pois onde achas que vão para o céu, ou para o fundo do mar....? Não, um dia destes voltam, vais ver, mais contentes e felizes que nunca"
":-Porque paga o teu pai impostos, porque todos pagamos, e muitos, devias saber quanto paga o governador, e eu, andamos todos de bolsos vazios muito piores que o teu pai..." e continuavam a rir o que incomodava Gianni, pois o assunto era muito sério.
De repente enquanto respondiam e riam ás gargalhadas, Gianni reparou que o nariz dos guardas não paravam de mudar de tamanho. Cresciam, cada vez que afirmavam algo e assim ficava! Pareciam doidos.
Começou a esfregar os olhos , a ver se era impressão dele, mas não. Estavam a mentir e a divertir-se com ele.
Saltou da cadeira onde o tinham sentado, pôs-se a correr e por mais que o chamassem e lhe dissessem "então não queres saber mais nada", ele só corria e pensava "já sei tudo".
Chegou a casa ofegante e disse ao pai de uma vez só.
:- Enquanto me explicavam tudo, o nariz crescia aos representantes do governador. São todos mentirosos, eu vi-lhes o nariz a crescer, se não sairmos daqui como os vizinhos da vila, tudo o que ganhares vai para o governo, a mãe nunca vai receber salário, tu nunca vais ter direito a votar, pois só vota quem o governo entende, e vem lá um periodo de greves, fome, e muita miséria e ficaremos muito pior que estamos agora.
Acabaram por emigrar em 1920 para S. Paulo, Brasil, que chegou a ser identificada como uma "cidade italiana" no inicio do seculo XX, onde as suas vidas não foram muito facilitadas ,nem a do Gianni, do Carlo nem a da mãe Giulia, mas onde com muito sacrificio e trabalho duro realizaram ao fim de alguns anos a compra de uma casa de habitação com um pequeno quintal, onde de um lado Gianni vendia móveis que fazia e concertava outros que lhe levavam e ao lado a mãe tinha um pequeno armazém, onde vendia um pouco de tudo mas essencialmente tecidos coloridos e vistosos.
Gianni estudou e veio a ser um grande jornalista.
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