Criticou-me com razão e não gostei do som que as suas palavras produziram em mim. Aquela frase que me disse, significava o que eu sabia muito bem que era verdade, mas não gostei de o ouvir ali repetido novamente. Considerava aquele assunto esquecido, encerrado.
Pudesse eu voltar atrás e apagava de vez todas as palavras por mim ditas uma a uma, de forma que o tempo as desgastasse na memória de quem as ouviu em tempos e não as esqueceu, que há muito já não falava dessas coisas com ninguém, e recordá-las ali não me foi particularmente agradável.
Sabia que durante muito tempo o acusara insinuantemente, pois encontrava nessa atitude uma forma de me libertar da prisão e vivência mal amada em que vivia, da forma grotesca como as coisas eram feitas, da falta de sensibilidade, mas que me importava isso ali, agora, se ele era, e é o meu pilar, o meu refugio, o meu apoio, o meu tudo e o meu nada, a minha força, o meu companheiro, de tantos anos, de ontem, de hoje, e de amanhã.
Ouve-me e eu ouço-o atentamente, sempre com a mesma disponibilidade, com a mesma cumplicidade de sempre, como se a minha função fosse essa, a de o escutar a ele e ele a mim.
As nossas refeições são agradáveis, não pela comida, mas pela companhia, que para comer qualquer coisa serve. Quando saímos a almoçar ou jantar fora é sempre diferente. Nas festas somos sempre óptima companhia.
Com a família (filhos) nem preciso descrever. Nas férias é sempre bom estarmos juntos, e conversando ou em silêncio a partilha é de paz e muita harmonia e é sempre com muita tristeza e porque não dizê-lo com lágrimas nos olhos, que o vejo sair no primeiro dia de trabalho.
É sempre difícil ficar só, sem ele fica tudo mais frio, o vazio é muito maior e o silêncio é muito mais longo e profundo.
Gosto de encostar-me a ele e em silêncio permanecer assim, fazendo dele o meu abrigo, sentindo-lhe o cheiro, o respirar, o bater do coração, e sinto que este encosto, esta nova forma de amar é bem mais forte mais sentida, mais divina, que o outro amor que reclamava ferozmente, que era carnal, pois este tranquiliza-me e dá-me paz.
Por vezes zanga-se e fala mais alto, eu tenho medo, fico triste, tenho que esperar que lhe passe. Também tenho dias em que me zango e ele atura-me…
Há dias em que faz e diz coisas que não gosto de ouvir, mas que posso fazer, temos um para o outro, tenho que engolir…
Nos dias em que anda mal disposto, parece as mulheres no período da menopausa, também eu estou nessa fase e ele está comigo…
Chega tarde e está ausente muitos dias, mas é por conta do trabalho. Longe vão as noites, as tardes e dias em que se ausentava como dizia “ porque tinha que ser” e me deixava sozinha e aos filhos. Agora e desde há muito, um carinhoso telefonema visita-me todos os dias pela hora de almoço.
Aquelas “cenas tristes” fiz delas um embrulho bem fechado e atirei-as para o mar um dia quando viajamos até ao Brasil e fizemos juntos um passeio de barco. Espero que os tubarões tenham comido a caixa…
Por onde ande há uma força enorme que me puxa para casa à sua espera, um abraço invisível sempre comigo, e mesmo á distância sinto que não me falta, que me entende sempre, que a sua voz se junta á minha e me apoia.
Ele é o meu maior e melhor amigo, o meu companheiro, o meu marido, um pai maravilhoso, o meu amante, o meu confidente, e ultimamente faz tudo para ser o meu melhor par bailarino.
Obrigada por me dares vida, que doutra forma já não era gente.
Provavelmente.
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