PURA Essência
No dia
que nasceu
Raiava
pela janela o Sol anunciando o verão
Ouviu-se
um choro
Uma
criança viera ao mundo
Mais uma
para colorir a vida
Mas num
segundo
Bastou
um olhar e tudo mudou
A cabeça
igual, perfeita, tal como o coração
O resto
era diferente, disforme
Não
parecendo gente
Nos
ombros só tinha um braço com mão
O
tronco, torcido, parecia sem jeito
E as
pernas apesar de duas,
eram
distintas de todas as que se tinham visto
Uma, com
coxa que podia ser perna,
a outra
com perna e coxa, mas muito encolhida
Ambas,
diferentes e com pés meio tortos.
Algo
acontecera durante a gestação
E a mãe
quando a viu pasmou:
chorou,
gritou, rejeitou aquele ser estranho.
- “Mas
que filho este, que feio é!
Santo
Deus que me traíste
Pedi-te um filho perfeito e deste-me isto
Senhor?
Oh meu
Deus, que sorte a nossa!
Que vai
ser de ti e de mim, minha filha,
filha
nossa, concebida com todo o amor….”
Só
depois o pai soube, e calado,
um pouco
amorfo
Chorou,
mas aceitou a menina.
E a
menina bebé depois de ver luz do dia
Chorava,
gritando num som aflito
Mas ao
escutar a palavra “filha” prendeu-se-lhe o respirar
ficou
suspensa,
parece
ter entendido tudo
olhou a
mulher que era a mãe
e
calou o chorar
Ouvindo
os seus gemidos de dor e lamentos
quedou-se
por encanto
Foi um
instante, um segundo apenas
Primeiro
a mãe recusou-se a olhar
Mas ao
olhá-la de novo
Viu nos
seus olhinhos um brilho raiar
Uma
chama reluzente que queria amar
Que lhe
pedia: colo, amor, carinho e proteção
E foi aí
que a mãe a pediu para si,
que a
agarrou forte
A pegou
bem contra o seu peito
E ambas,
unidas,
choraram
enfim juntas até que o choro acabar
Tinha
que terminar
Já se
conheciam há muito,
sentiram-no
no cheiro daquele abraço primeiro
No bater
do coração de uma encostada à outra
A menina
parecia sorrir
Queria a
mãe e ambas naquele abraço se reconheceram
“- A
minha menina há de ser uma grande mulher”
Foi o
que a mãe, resignada, com amor lhe disse.
E a
menina cresceu,
A
jornada foi longa, penosa,
mas a
meta atingida
Ficou
pequena, mas fez-se grande na alma
E a mãe
de joelhos postos,
foi sempre,
como
hoje ainda,
do
tamanho dela,
sem
complexos, sem mágoas,
que
estas o tempo tratou de curar e sanar.
Como
todas as meninas, ela brincou
Foi à
escola e aprendeu de tudo
Fez
amigos que lhe deram colo e mimo
E a
menina cresceu, estudou no liceu
E na
universidade colocou cartola
E mesmo
torta, diferente por fora
Fez-se
doutora como muita gente
Com as
pernas trocadas,
um braço
uma mão
e um
coração maior que o universo
Ela
aprendeu mais que tudo
Mais
ainda que os outros
Muito
mais que eu e tu
Aprendeu
a dar-se valor
e a cada
coisa que via e dava atenção
Cresceu,
cresceu tanto na alma e no coração
Que ama
toda a gente
E hoje
se diz ser feliz assim
- “Eu
não sou diferente,
sou
incompleta à vista,
o que
não me atormenta
só
apoquenta os outros,
os que não vêm direito, sabias?
Tenho
auto estima do tamanho do mundo,
conheço
todos e todos me respeitam,
sou
escritora e poeta,
trabalho,
dirijo uma biblioteca.
Tenho
uns pais que me amam,
uma
família que adoro e me quer só bem
Sou tudo
o que quero
Grande,
pequena, torta, direita
Isso não
me importa
Sou uma
privilegiada,
sou
mulher, viajo pelo mundo
sei
fazer tudo e o que não sei, invento.
Porque
me hei de preocupar?
Só
porque para me sentar preciso de um assento baixo?
Porque
uso vestidos curtos?
Mas eu
gosto!
Ando,
corro, faço girar o mundo
Deus
deu-me pés e alma para isso”
E com
isto cala todos,
calou-me
a mim quando a conheci.
Faz
feliz a mãe e o pai,
que vendo-a feliz
são
felizes também.
Sendo
pequena, disforme no corpo,
tem um
saber que não cabe no mundo.
Obrigada
Li por tudo o que me ensinaste.
Contigo
aprendi a ver o Sol e a vida de forma
atenta
A saber
que muitas vezes há luar
Mas com
a pressa até me esqueço de mirar a Lua
De olhar
o céu e contar as estrelas uma a uma
Apreciar
bem o ondular do mar,
o valor
e beleza da sua espuma.
A ver as
pessoas uma a uma por dentro
E nunca
pela figura que por fora apresentam
É tão
bom saber viver, amiga minha.
Minha
amiga doce e linda Li.
DE :Inês MAOMÉ
16/10/2013
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