sábado, 10 de abril de 2010

O namoro

Algumas vezes Isabel pensou que aquele namoro não era o que sonhara. De vez em quando tinha pesadelos e chorava, acordava aflita sem entender as suas angustias.


Tinha imaginado, a sua relação com alguém um pouco diferente da que tinha com Pedro, tanto pelas restrições que lhe eram impostas, como pelo feitio dele. Sempre que estavam juntos eram sempre as mesmas coisas que ocupavam os dois. Conversavam, trocavam carícias, falavam até de algumas coisas do futuro, mas tudo era aflorado ao de leve sem grandes preocupações. Muitas vezes as viagens de comboio, no período de aulas, eram feitas com o Pedro a dormir. Cansado das noitadas e aproveitando o balanço do comboio em vez de conversar e namorar com Isabel, dormia.

Em frente de pessoas ou amigos, Pedro nunca exteriorizava qualquer gesto de carinho além de o apertar das mãos. Isabel queria mais. Gostava que ele fosse como o João era para a namorada. Ao principio nem o nome dela referia. Não tinha com ela nenhum tratamento mais carinhoso e isso deixava Isabel triste.

Isabel ainda recordava aquele casal de noivos, que há muitos anos atrás tinha visitado, e que a tinha impressionado tanto. Pedro nunca seria assim.

Sempre de mãos dadas, enquanto ele dormia no comboio, ela ia experimentando sensações diversas enquanto pensava tudo isto, imaginando que um dia se conheceriam melhor. Ia adiando sempre para o dia seguinte um monte de duvidas que tinha e que queria colocar ao Pedro. Chegou a sonhar com tudo isso, e acordava em sobressalto, muitas vezes a chorar, quando em pesadelos via, que ele se ia embora e a trocava por uma qualquer colega de curso ou até do teatro, com quem passava tantas noites bem mais acordado, do que nas viagens de comboio que fazia com ela.

Sobretudo Isabel não queria perder Pedro, que já fazia parte da sua vida, ou seria que não tinha essa certeza?

A certa altura Isabel já não era capaz de decidir coisa nenhuma. Acabar aquele namoro era impossível. Os pais e toda a família de um e outro lado, não iriam entender essa rotura, iriam dizer que ela era doida, todos iriam falar dela como sendo leviana, coisa que ela não era. Os pais de Isabel teriam uma reacção completamente desconhecida para ela, mas que não seria boa , e assim o melhor era suportar tanta ausência, tantas tardes e fins de semana sozinha, tantas idas do Pedro não sabia ela para onde, nem com quem, tantos lanches, encontros e merendas para os quais Isabel até podia ser convidada pelo Pedro, mas não era, e guardar no fundo do seu coração um sentimento de mal amada que desde pequena sentia e que cada dia arranjava maneira de não parar de aumentar.

Sim desde muito cedo Isabel sentia-se mal amada pelo Pedro. Pelo carinho e amor que lhe dava sentia que merecia mais atenção da parte dele.

Pedro não teimava ou exigia que ela fosse com ele nunca, nem se impunha a pedir aos pais dela que queria que ela o acompanhasse, parecia que ambos os lados se tinham combinado, e nem diálogo sobre o assunto existia. Isabel tinha que se contentar com o que parecia estipulado por algum juiz. Por outro lado este sentimento de mal amada que já vinha de menina, juntamente com todos os que faziam também parte da sua maneira de ser, transformavam-na numa rapariga incompreendida, ansiosa, triste, com medo e vontade de fugir para bem longe.

Como ela gostaria que Pedro fosse um pouco diferente, mais atencioso, mais carinhoso e mais companheiro. Ela queria muito ser indispensável para ele, mas sabia que não era.

Em casa continuava a ter problemas familiares e como antigamente muitas vezes interferia nas discussões dos pais, chamando-lhes a atenção para atitudes menos correctas. De alguma forma tentou encobrir perante Pedro a maneira de viver dos pais, e nunca deixou transparecer tudo de terrível que a tinha marcado na infância. Pedro já sabia que ela era ansiosa e chegava. Os motivos mais tarde, talvez lhos contasse. Ele nunca iria entender o que viveu na sua infância, nem perceberia o quanto isso a tinha marcado.

Pensava que com certeza as suas exigências para com Pedro tinham a ver com isso, e calava e aceitava tudo sem criar problemas e sem se lamentar, com a esperança que o futuro lhe seria risonho. Pedro era para ela além do namorado, o amor, o amigo e confidente, um companheiro. Já tinha decidido que era com ele que iria ficar, e não ia fazer nada para que ele a deixasse. Um dia seria o seu marido, o pai dos seus filhos. Tinha a certeza que ele seria sempre seu amigo e companheiro, mas também sabia que para conseguir isso, tinha que lutar muito.
Ela tinha muita vontade de ser feliz e conseguir que Pedro se transformasse no namorado e marido romântivo que ela sonhara sempre.



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