quarta-feira, 7 de abril de 2010

O azul

Naquele dia Isabel acordou animada. Deixou-se ficar na cama até que o corpo lhe pediu e o tempo permitiu. Escreveu, leu e sonhou como seria tudo nesse dia. A hora do pequeno-almoço passou, mas não tinha fome. Estava tão tranquila, que nenhum dos seus órgãos reclamou coisa nenhuma.

Levantou-se e fez em casa absolutamente o necessário. O dia era demasiado importante para se preocupar com ninharias. Um almoço rápido mas suficiente, tapou as necessidades de manutenção de energia no corpo.

Na hora de se arranjar para sair, Isabel pensou que naquele dia tinha que parecer bem, e tentou arranjar-se como uma senhora muito segura de si. Ela estava realmente muito segura de si.

Quando chegou á livraria, ia estranhamente calma. Pelo sim pelo não antes de sair de casa, tinha tomada o comprimido milagroso que em situações limite, funcionava sempre.

Aquela era uma situação nova, diferente de todas as que já tinha vivido, mas era a mais importante de todas. Nem casamentos ou nascimentos, baptizados ou comunhões, namoros ou trabalhos, ou fosse o que fosse tinha tido alguma vez importância para ela, como aquele acontecimento.

Entrou e ficou inebriada pela cor, pelo cheiro. Tantos livros e todos pareciam ocupar o sítio certo.

A montra azul denunciava logo o que passava. Lá dentro o azul espalhava-se por todo o lado. Ao redor livros de todas as cores, e conteúdos preenchiam o espaço da livraria. Isabel sempre gostou de livros apesar da dificuldade em escolher os que deveria realmente ler. Sempre adorou o cheiro dos livros. Todos eram o que desejava. Mas todos, não eram os possíveis para ela. Isabel nunca conseguiria entender o que a maioria deles dizia. Não fora muito boa a português, e sempre entendeu melhor com o coração, mas a vontade de ler histórias que a fizessem sonhar e voar para outros universos, era mais forte.

Sempre gostou do cheiro dos livros, desde muito cedo, quando passou um ano fechada em casa doente, que gostaria de ter podido ler histórias de encantar. Por isso ficou por aí, e são ainda essas as histórias que povoam a sua mente.

Apareceram amigos, familiares, companheiros, professores, colegas, muito bem postos e animados, embebidos da mesma vontade de participar e acompanhar aquele momento primeiro e único.

Isabel com uma calma que não lhe era muito familiar, gostava de tudo o que via e muito mais do que sentia. Todos estavam bem, e aquele menino homem de camisola vermelha com um blazer, era o seu rei. Movimentava-se por entre prateleiras, mesas de livros e pessoas, como se aquela fosse a sua casa. Isabel sabia que ele estava feliz como nunca, e a sua pequena estrela, movimentava-se igualmente feliz como ele, espalhando os dois, naquele espaço um brilho de luz, calma e felicidade que aos poucos contagiou toda a gente.

A eloquência das palavras ditas e ouvidas entrara no coração de Isabel e lá permaneceram para sempre. Á frente viu, ouviu, compreendeu e sentiu tudo, como nunca. Viveu os momentos mais encantadores e fascinantes de toda a sua vida, sem medos sem nervoso ou ansiedade. A felicidade e emoção contagiaram toda a gente. Na sua mente a imagem do menino rei, de camisola vermelha que falava com a alma e com toda a inteligência e magia, ficaram gravadas para sempre no seu espírito. Isabel sabia que o seu Sol nesse dia brilhou mais alto, e que cada vez brilharia mais.

Por momentos o mundo todo estava ali e por aquele momento tudo tinha valido a pena. Um enorme raio de luz brilhou naquela sala e a emoção que envolveu todos os presentes fez perpetuar para sempre a magia daquele momento.

Isabel não sabia o que dizer, o que pensar. Estava calma e irradiada de uma felicidade como nunca. As lágrimas eram de eterno prazer e felicidade. Não tinha vontade de mais nada. Queria não sair mais dali.

Beijos, abraços, parabéns, tudo devido e merecido, e tudo, muito pouco para tão grande feito.

Isabel, foi se despedindo das pessoas, que satisfeitas iam abandonando comovidas a livraria. Abordando os seus pais também presentes neste acto, e demais felizes pelo acontecimento, Isabel deu um beijo á mãe que ao ouvido lhe disse,"anda vá, dá um beijo ao pai ", beliscando-lhe o braço, e empurrando-a para ele.

A mãe de Isabel não sabe, mas isso incomodou e entristeceu Isabel, que nunca deixou de cumprimentar o seu pai. Seja como for aquele é o seu pai, e ela sempre o respeitou. Por mais que peça á mãe que não o faça, ela repete este gesto continuadamente.

Por mais que coisas extraordinárias  aconteçam na vida de Isabel, há sempre uma nuvem a pairar por cima dela. Por isto sim, abençoado comprimido.

Por tudo o resto abençoada a hora em que num dia de feriado, o anestesista chamado de urgência, com a ajuda do médico fez vir ao mundo o "rei", como depois do parto comentou, (que Isabel bem ouviu)"era uma pena perder-se". E era, só que eles ali, não sabiam quanto.

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