Dona Joaquina não entendia aquele seu comportamento estranho e atribuía todas as culpas à ausência do Rui Manuel e à falta exagerada de apoio do filho para com a nora, pois na verdade verificava que ambos passavam muito pouco tempo juntos, e que Manuel estava muito tempo fora de casa, não disponibilizando muito ou nenhumas atenções para a esposa.
Muitas vezes quando conversava com ela, percebia muito bem que a Justina parecia que apesar de estar a olhar para ela nem sequer estava a ouvir o que ela lhe dizia, limitando-se a concordar com tudo e pouco mais. Resolveu até aconselhar o filho, dizendo-lhe que o melhor era levar Justina a um médico, pois assim não poderia continuar. Estando em casa era como se não estivesse. Justina poucas ordens dava em casa aos criados, deixando tudo ao seu critério, e ela já se sentia velha e cansada para tomar a casa a seu encargo e para a ver assim abatida, e para a ver a concordar com tudo. Com tudo isto, cada vez a notava mais isolada e isso preocupava-a muito. E ainda a senhora não sabia o que vinha de trás. O filho concordou e iria procurar um bom médico para a levar, ainda que a ele o estado dela, não o perturbasse.
Helena continuava nos seus estudos perfeitamente, e um dia com a direcção que Celeste lhe dera no bolso meteu-se num táxi e foi até aquela casa. Aquele era o ponto de partida. O que diria quando chegasse logo se viria conforme quem a recebesse.
Quando bateu à porta o seu coração parecia querer saltar-lhe do peito. Quem a viesse atender, havia de lho ver a bater de tanto que lhe fazia saltar a blusa. Algo lhe dizia que ali ia saber qualquer coisa acerca do que procurava.
-Diga, que deseja?
E Helena sem saber o que dizer foi directa ao assunto.
-O senhor Capitão Henrique está?
-Mas quem é a menina, para aqui vir perguntar, pelo senhor Capitão?
E a pessoa que atendeu à porta Helena não era muito nova, mas também não era velha, e Helena imaginou que fosse mãe da amiga da senhora dona Justina, e não se intimidou.
-Olhe sabe, fui madrinha de guerra de um militar que devia pertencer ao esquadrão do senhor Capitão Henrique, pois um dia numa carta ele mandou-me esta direcção já nem me lembro a que propósito, e fala-me sempre muito bem do seu capitão. Gostava muito deste meu afilhado, mas não sei o que lha aconteceu. Decerto deve ter acabado a sua comissão no Ultramar e regressou à terra, pois não me voltou a escrever. Pensei que sendo assim talvez o senhor capitão conhecendo os seus soldados, conhecesse o paradeiro deste meu afilhado de guerra.
-Boa madrinha que esse maroto que não lhe escreveu mais, tinha. E não lhe mandou fotografias suas. Se visse realmente como é bonita não havia de a querer perder de vista.
-Não sei minha senhora, até pensei que lhe pudesse ter acontecido alguma coisa má. Algum acidente de guerra, pois não acontecem só aos outros. Mas estou ansiosa por saber dele e se a senhora me puder ajudar. Esse senhor Capitão por onde anda, será que posso falar com ele?
-Pois não sei verdadeiramente ao certo por onde anda, mas sei que não está no Continente, isso infelizmente sei, e sei mais.
-Assusta-me, mas morreu esse senhor?
-Não calma, mas podia estar melhor.
-Ai sim então conte-me, pode ser que me ajude a encontrar o meu afilhado.
-Teve um grande acidente no início do ano de 65, ou no final de 1964, não sei bem e ficou tão mal que o deram como perdido para a vida. Foi apanhado por uma mina. Mas nesta altura não sei o que é feito dele. Só sei que perdeu uma perna, e ficou com algumas deformações pelo corpo e no rosto que ainda devem estar a tentar tratar lá no Ultramar onde está. Este Natal a minha filha vem passar comigo a consoada, depois dessa altura volte cá, que eu pergunto-lhe e pode ser que ela saiba dizer mais alguma coisa sobre o esquadrão com o qual ele trabalhava. Quem sabe esse seu afilhado já está em casa, ou talvez não.
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