quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

O casamento da NITA

Olhava para si e sabia que não era aquela noite que tinha desejado para a sua noite de núpcias. Resolveu que ninguém o iria saber e devagar depois de ter lavado algumas partes do seu corpo, pois não conseguiu ligar o esquentador e a água estava gelada, encostou-se na cama e lá adormeceu encostada ao marido que dormia profundamente.


Curiosamente nessa noite não sonhou, mas de madrugada sentiu o seu corpo a ser percorrido por umas mãos que lhe eram familiares ao toque, e meio a dormir meio acordado foi correspondendo a cada gesto do seu amado, até que se envolveram num acto de amor lindo e terno como todas as noivas esperam ter numa situação destas.

Assim com alguma facilidade Nita esqueceu a carreira imensa de botões que teve de desabotoas na noite anterior para conseguir despir o seu vestido completamente só. Mas será que o esqueceria para sempre?

A vida de ambos estava só a começar e a partir dali tudo o que fizessem seria da responsabilidade dos dois. Será que estavam preparados para isso?

Passados nove meses, em Outubro nasceu a Beatriz uma menina linda, muito parecida com a mãe, mas durante estes nove meses, muitas cenas indesejáveis tinham acontecido na casa de Nita. Por vezes, alguns pratos e tachos voaram pelo ar indo parar ao chão, amolados, ou feitos em cacos. Carlos continuou muitas vezes a deitar-se sem se despir, pelo facto de chegar a casa embriagado, e Nita apesar de muitas vezes se repetir a cena do dia a seguir ao casamento, deixou de encontrar graça e interesse no estado do marido e no seu comportamento nessas circunstâncias.

Estava cansada das suas atitudes e quando o via chegar a casa trôpego, a trocar as pernas e a não conseguir dizer duas palavras seguidas, discutia e dizia-lhe constantemente que ele tinha de se tratar.

Nesta situação discutiam muito, demais até, e um dia aconteceu, Carlos empurrou e bateu até lhe apetecer na sua mulher. Nita barafustava e tentava proteger o seu bebé, que nesta altura ainda não tinha nascido, mas ficou magoada e sentida de uma forma sem explicação.

Desta vez não diria nada a ninguém mas para a próxima se ele o voltasse a fazer, diria para toda a gente o que ele lhe fazia sempre.

Beatriz entretanto nasceu, uma menina linda e robusta que depressa ficou aos cuidados da avó Fernanda para a mãe conseguir ir trabalhar. Agora ao contrário dos tempos de solteira, Carlos discutia com Nita pela forma audaz e meio exibida como esta se vestia:

- Nem sei porque não te despes mais? Aperta esse decote. Raios, nem sei como consegues andar com essa saia tão justa e esses sapatos tão altos?

- Conheceste-me assim, não foi? Então não sabias que era assim que gosto de me arranjar? Não sei porque refilas agora?

- Ficas indecente e parece que te vais vender a alguém.

- Indecente, eu? Tadinha de mim, sempre com os mesmos trapos. Vai mas é trabalhar que o frigórico não enche se lá não metermos coisas dentro, e deixa de ser bruto, olha a menina.

E muitas vezes a menina já crescidita ouvia tudo. Nesta altura pegava na sua boneca, sentava-se no rebato da porta do corredor escuro que dava para a rua e cantava, cantava cada vez mais alto, para evitar ouvir as vozes dos pais a discutir e muitas vezes o barulho dos cacos da loiça quando esta se espatifava no chão:

“Dorme, dorme meu menino,

que a mãezinha logo vem,

foi ganhar o dinheirinho,

pra dar papinha ao seu bem.”

Esta a cantiga que a avó Fernanda lhe cantava para ela adormecer quando a deitava para as sestas à tarde.

Depois da Nita não suportar mais, contou muitas coisa à mãe, que já sabia muitas coisas porque a menina lhe dizia muitas vezes:

- O pai é mau dá tau-tau na mãe e grita muito. É feio.

Fernanda achava que o melhor era a filha convencer o Carlos a tratar-se do vinho, pois esse andava a dar cabo dele e da família, e a vestir-se de outra maneira pois também reparava que ela se amostrava que parecia querer arranjar homem, mas se já tinha um, tinha que moderar esse seu jeito de sair à rua.

E Nita sabia disto pois continuava a ouvir os piropos do José da mercearia e de outros. E ela gostava disso, pois quando os ouvia o seu andar refinava e ela parecia que crescia em cima dos seus sapatos altos.

Fotos do Google

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