terça-feira, 12 de abril de 2011

Falta de noticias

O pior foi o capitão começar a deixar de escrever à sua senhora.
Realmente aquele Inverno foi deveras muito rigoroso, demais até, tendo em conta que as duas estavam fartas de estar ali isoladas desde o inicio de Outubro. Desde que as cartas do Capitão falharam, Justina começou a andar triste e começou a ficar sem apetite. Porque seria que Henrique não lhe escrevia mais, teria acontecido alguma coisa?

-Helena, se aconteceu alguma coisa a Henrique ninguém me avisa. Não posso perguntar nada à minha amiga, pois daria nas vistas, e se lhe aconteceu algo mais grave, a mim o Estado não avisa, pois não sou da família. Algo me diz que algo importante lhe terá acontecido, mas não sei o que será.

-A minha senhora aqui a afligir-se, e esse seu Henrique lá no Ultramar com alguma mulata namoradeira. A senhora desculpe, mas tem que estar mais bem-disposta porque as cartas podem estar perdidas e um dia destes aparecem todas juntas. Tem que se animar, que os homens por vezes são matreiros, foi sempre o que a minha mãe me disse, e a Celeste também.

-Não sei se me fazes rir, se me pões ainda mais aflita. Não sei de facto o que pensar, mas a culpada fui eu que até hoje apesar de estar aqui ainda não lhe disse que espero um filho dele.

-Não sei. Mas a senhora se fosse pequena levava agora uns bons acoites. Então com tanta carta escrita, ainda não lhe disse que espera dele este filho? Santo Deus porque espera, que ele adivinhe? Ele à cada uma?

-Helena queria tanto tê-lo aqui comigo, mas imagino que ele na guerra está tão aflito que não quero preocupá-lo mais.

-Imagina mal, pois eu penso que para ele seria um estímulo para ter mais força para levar essa guerra avante e ter força para voltar cheio de garra para a senhora.

-Mas se lhe dissesse, ia divulga-lo alegremente à prima, e a prima à amiga e a esta hora Lisboa inteira sabia e o Manuel também, pois a dizer-lhe, não lhe podia pedir segredo ou podia? Pensei nisso tudo e tive receio disso tudo. Penso que não devia ter pensado tanto.

-Com certeza não devia mesmo ter pensado tanto e devia ter feito o que lhe mandava o coração. Assim ainda perde tudo, e Deus queira que não, que só desejo que a senhora seja muito feliz.

Helena neste Inverno enquanto Justina de consumia com a espera das castas e que o filho nascesse, aprendeu muita coisa, geografia, ciências, aprendeu a conhecer o corpo humano. Até a ler francês, e dizia a senhora que ela era uma boa aluna. Naquele tempo tudo o que Helena fazia além de cuidar da sua senhora da melhor forma possível era passear, ouvi-la sentada na mesa da sala com a lareira acesa como se estivessem numa sala de aula. E Helena absorvia cada palavra com todo o interesse e curiosidade.

Entretanto chegou a primavera e as folhas amarelas que há muito tinham desaparecido levadas pelo vento e depois cobertas pela neve daquele Inverno rigoroso, recomeçaram a aparecer verdes nas árvores dos bosques e florestas. Era o tempo de novas vidas renascerem.

A meados de Fevereiro, sem nada o fazer prever, pois não era ainda a altura, umas dores repentinas levaram Helena numa correria à aldeia chamar o médico para a sua senhora que precisava de ajuda, pois estava com uma crise de falta de ar desde a noite anterior que não passava, foi a razão que ela alegou para a necessidade do médico em casa. Chamado o médico de repente, Helena vai a correr de volta para casa, dizendo não precisar de mais ajuda além do medico para auscultar a senhora. Chegada a casa, põe muita água ao lume porque as dores não passam e falando com a senhora tem a certeza que a criança deve estar para nascer antes do tempo. Justina andava muito nervosa a tensão muito alta, e o importante era que a criança estivesse bem, mas com aquele tempo devia estar ainda muito pequenina, pois só tinha sete meses. Helena sempre ouvira dizer que com sete meses escapavam com oito é que não, vá se lá saber porquê, e com isso e massagens que foi fazendo na barriga da senhora como fazia na mãe, até que o médico chegou, foi acalmando a senhora.

O facto de Helena ter chamado o médico para ver a senhora em casa, só ajudou a prolongar mais uns tempos a estadia delas mais uns dias por ali perante a família em Lisboa, que assim foi sendo enganada. Na primeira oportunidade, assim que Celeste telefonou o pessoal da loja avisou-a logo:

“-O médico foi ver a senhora que esteve uma noite inteira com falta de ar.”
Ao que ela terá respondido:
“-Mas quando é que aquelas duas vêm dali para fora, ainda tenho que ser eu a ir lá busca-las.”

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